1 INTRODUÇÃO
Força, palavra derivada do latim que significa toda faculdade de operar ou de remover, cujas ações se dizem poder, esforço, vigor, energia e violência. Como entendido, encontra-se em várias ramificações e formas dentro do vocábulo e na sociedade, mas a que interessa é a força policial, pois está investida de poder enérgico que, na atualidade encontra-se revestida em outra fase as violências descabidas, desvirtuando o sentido da ação legitimada que esse instituto fornece.
Sendo a polícia detentora de tal instituto que a sociedade lhe atribui por meio do Estado Democrático de Direito e dentre as instituições, a Polícia Militar do Estado da Bahia é uma das mais antigas, com mais de 180 anos de história, e, neste percurso, observam-se muitos entrelaces na confusão de sua missão e no desvirtuamento de seu poder de polícia ou força policial na abordagem ao cidadão, sendo desproporcional aos meios utilizados.
Deste modo, atingindo a dignidade da pessoa humana, ferindo a Magna Carta e os direitos humanos, neste momento encontra-se o discurso na área da segurança pública o caminho da legalidade e qual a linha tênue para a ilegalidade na abordagem policial.
O presente trabalho monográfico tem como proposta apresentar um questionamento mais aprofundado da atividade policial militar no excesso de força contemplada na abordagem policial ao cidadão baiano, consolidando assim uma violação dos direitos humanos.
Considerando-se o novo contexto histórico vivido pelo povo brasileiro com o advento da Constituição Federal de 05 de outubro de 1988, surge o interesse por esse tema devido ao conflito do velho modelo de polícia criado na época da ditadura militar e assumido pela nova ordem constitucional, pois ao longo desses 21 anos de democracia, pouco foi feito para evolução da Policia Militar baiana (PMBA).
A polícia que cuidaria diretamente da proteção ao cidadão e reprimia o cidadão infrator dentro do que está previsto na Constituição Federal, hoje é a face e semelhança do militarismo de outrora, com homens preparados para o combate e não para lidar com as infrações penais, agindo sem distinguir o cidadão de bem dos seres humanos que se encontram à margem da lei, tudo em benefício de uma classe dominante.
Assim surge o seguinte problema: em que situações a Polícia Militar do Estado da Bahia apresenta casos de excesso de força policial na abordagem do cidadão baiano, a partir da Constituição Federal de 1988?
Deste modo, busca-se como objetivo geral, identificar em quais situações a Polícia Militar do Estado da Bahia apresenta casos de excesso de força policial na abordagem do cidadão baiano, a partir do advento Constitucional de 1988. Para cooperar com o estudo devem-se detalhar objetivos os específicos:
a) identificar o que é uso legitimo da força;
b) identificar como o violento estresse psicológico ao qual o policial militar é submetida influencia no excesso de força policial na abordagem;
c) observar se a condição de policial militar retira do ser a condição de cidadania;
d) verificar como o corporativismo macula a ética profissional;
e) verificar como a instituição Policial Militar do Estado da Bahia exerce controle e disciplina os policiais militares quando infringem os direitos humanos dos cidadãos pelo excesso de força policial na abordagem;
Na nova ordem constitucional, surge um horizonte novo a ser alcançado que é a dignidade humana, não cabendo a repressão contra a vida e a liberdade do ser, tolhida antes pelos ditames da ditadura militar.
Nesta visão, por meio das instituições democráticas reformuladas pela nova Constituição, após 21 anos de democracia, observa-se que as instituições policiais militares, que deveriam estar a serviço do povo, encontram-se desvirtuadas de suas funções, quando se utilizam indevidamente da força policial para atingir quaisquer outros meios, principalmente na abordagem policial agredindo a quem deveria proteger.
Desta forma, consoante a história tem demonstrado, a polícia tem o significado na semântica da expressão perfeição social, mas encontra a veredar em sentido oposto.
O presente estudo visa identificar e tentar sugerir resgatar pontos da instituição, para que evolua dentro do Estado Democrático do Direito, sendo a força o último recurso a ser utilizado pelos seus integrantes, principalmente a força letal e, ainda mais, em uma abordagem policial.
Pode-se observar que a fundamentação teórica será embasada na linha de pensamento de vários doutrinadores dentre eles Piovesan (2007), Carnelutti (2008), Cunha Júnior (2008), Greco (2009), Hobbes (2008) e outros, como se trata de uma problemática pouco explorada dentro do ramo do direito e, além disso, de uma notória complexidade, mostra-se oportuno situá-la teoricamente.
Para tanto, foi de fundamental importância a realização de uma pesquisa bibliográfica, por meio da qual, seguindo uma orientação teórica bem consistente e apropriada à temática, ficaram evidentes as posições ocupadas pela PMBA frente aos conceitos mais relevantes para o estudo, quais sejam: a ideologia do uso indiscriminado da força contra na sociedade em beneficio do Estado.
Posteriormente, após ter exposto algumas possíveis contradições teóricas, considera-se cientificamente prudente empreender um estudo aprofundado que possa interagir ou até mesmo contradizer os primeiros escritos.
O recurso metodológico visou a delimitação das contradições do papel da PMBA como servindo ao Estado em vez da sociedade, no aspecto do excesso da força na abordagem policial militar, levantado, ainda, o aspecto sobre as possíveis implicações objetivas destas contradições da instituição policial, tanto para os cidadãos quanto para os policiais militares.
Em uma concepção histórica, a construção da ideológica militar que delimita as funções das instituições que marcam os modos de pensar, sentir e agir das pessoas que as compõem e, também, daqueles que delas se servem.
Desse modo, alguns elementos foram analisados, a fim de legitimar o propósito do trabalho: ideologia da instituição PMBA braço forte do Estado em detrimento da sociedade e no abuso do poder constituído. A análise realizada teve arrimo nos posicionamentos doutrinários esboçando os conceitos de tais elementos.
Por meio do estudo dos conceitos supracitados, objetivou-se compreender os aspectos históricos, culturais, sociais e políticos que levam a idéia de que a PMBA serve ao Estado e não a sociedade em comum.
Da análise sobre o conceito de sociedade, discuti-se a respeito da estrutura e da dinâmica social especialmente caracterizada pela divisão do poder na estrutura organizacional do Estado e seus membros e sobre a repercussão dessa divisão para atividade policial militar no uso da força. Enfim, ainda a partir da crítica marxista, a discussão sobre Estado mostrou-se fundamental, uma vez que a PMBA é uma instituição estatal e, portanto, como funções dessa natureza podem refletir no Estado Democrático de Direito no desempenho das atividades da PMBA em momento histórico, vivido nessa era.
O universo a ser pesquisado neste projeto é a relação entre o uso da força policial na abordagem e os direitos humanos após a Constituição de 1988, que define o estado democrático de direto.
Foram analisados artigos publicados e livros relacionados com o desenvolvimento democrático das instituições policiais militares no uso legitimado da força e aplicação efetiva dos direitos humanos em benefício do cidadão baiano. São análises de conteúdo buscando a semelhança com os artigos de outros profissionais.
No momento inicial desta monografia, discute-se o uso legítimo da força, bem como a sua proporção exercida e quando esta deve ser realmente aplicada com o fim de se estabelecer o seu uso dentro da legalidade ou quando se configura ato ilícito; a realidade da policia cidadã dentro do Estado da Bahia e realmente qual a sua eficiência.
No momento posterior, é discutido o trabalho do policial militar da Bahia e sua atividade laboral desempenhada, assim como observar se há desvio de função, como se dá a disciplina militar e qual a sua eficácia no Estado Democrático de Direito. De igual forma, é analisada, neste momento, a ética profissional e o corporativismo quando atos criminosos passam a ser protegidos, discutindo-se, ademais, se isso é ético ou um falso corporativismo, o estresse psicológico dentro da atividade policial militar, quando isso ocorre e a forma como afeta os cidadãos, o próprio policial e sua família.
E, finalmente, discute-se a conclusão, abordando algumas correntes doutrinárias e possíveis contradições teóricas, pois o assunto é inquestionavelmente revestido de polêmica, haja vistas aos constantes casos noticiados pela imprensa.
Deste modo, examina-se uma discussão entre a problemática e a análise sobre a mesma e no decorrer desse trabalho monográfico depara-se com diversos pensamentos de discursos filosóficos e científicos de vários autores no qual o tema não se esgota, sendo sempre atual.
2 TEORIA GERAL DOS DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS
Entre as constituições de 1824 a 1988 passa por vários períodos históricos onde há construção dos direitos fundamentais do ser humano que finalmente consolida, com o principio constitucional da dignidade da pessoa humana que rege história atualmente, não cabendo qualquer retrocesso a tempos de leis draconianas. ‘Basta, por ora, que essa multifuncionalidade dos direitos fundamentais seja examinada à luz da clássica, mas atual, teoria do status de Georg Jellinek, e por algumas considerações acerca das funções de defesa, de prestação, de proteção perante terceiros e de não discriminação dos direitos fundamentais. ’
Nesta visão à construção do conceito de direitos humanos se solidifica em um cenário sócio-jurídico na totalidade atual. (CUNHA JÚNIOR, 2008 p.522).
2.1 CONCEITO
O desenvolvimento do conceito único cabe aos diversos tratados internacionais as quais o Brasil é consignatário de todos os acordos em prol da vida do ser humano ‘[...] concluímos que os direitos fundamentais são todas aquelas posições jurídicas favoráveis às pessoas que explicitam, direta ou indiretamente, o principio da dignidade humana, que se encontram reconhecidas no texto da Constituição formal (fundamentalidade formal) ou que, por seu conteúdo e importância, são admitidas e equiparadas, pela própria Constituição, aos direitos que esta formalmente reconhece, embora dela não façam parte (fundamentalidade material)’ conforme esse pensamento edifica-se um conceito moderno no desenvolvimento dos direitos humanos no entendimento desse trabalho monográfico (CUNHA JÚNIOR, 2008 p.520).
Em outras palavras, os Direitos Humanos Fundamentais se tratam de direitos surgidos ao longo da história em virtude do aparecimento de contingências, caracterizando-se, justamente pelas lutas travadas ou contra as arbitrariedades do Estado ou contra as próprias condutas praticadas por particulares.
Tratam-se de direitos que servem para se opor às condutas arbitrárias do Estado, bem como para exigir do ente estatal comportamentos direcionados à realização das necessidades sociais, tendo como norte a otimização do princípio da dignidade da pessoa humana.
Tais direitos são considerados fundamentais justamente por serem essenciais à condição humana, essenciais à convivência humana e por servirem de pilar ético-jurídico-político para justificar o impedimento de condutas praticadas pelo Estado, bem como a imposição de políticas públicas voltadas para a realização das necessidades sociais (Dirley, 2010, pp. 518-519).
Portanto, tratam-se de direitos essenciais ao ser humano, sem os quais o mesmo não se realizam, não se perfaz enquanto pessoa.
Como dito acima, os Direitos Humanos surgem ao longo da história, variando no tempo e no espaço, tendo em vista as diferentes contingências e necessidades surgidas em cada momento e em diferentes contextos, razão pela qual impõe-se, a seguir, promover uma breve análise da evolução histórica dos mesmos, bem como analisar as gerações.
2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA
A evolução histórica dos direitos humanos fundamentais surge a partir da necessidade de sobrevivência, da humanidade e da sua proteção, nesta concepção. [...] A compreensão histórica dos direitos fundamentais, portanto, exerce um papel extraordinariamente importante, pois permitem verificar a variedade de condições de realização dos direitos do homem, dentro da unidade do gênero humano, as experiências em confronto, ora de sedimentação, ora de crise e a descoberta de novos percursos e novos avanços.
Segundo essa linha de pensamento, evoluiu pouco em 21 anos de democracia os direitos humanos e sua efetivação em passos de milímetros, mais argumenta a dizer que apesar da lentidão histórica há uma constância no processo evolutivo.
E dentro das constantes evoluções, vários abusos físicos a partir de tortura em todos os âmbitos com a desvalorização da vida e com sua moral atingida também com a pior das barbáries humanas a destruição do ser pelo seu psicológico. Pois ocorre em sentido subjetivo que se denomina também tortura, mas que só marca a alma do ser humano que dificilmente retornará a seu “status quo ante” (CUNHA JÚNIOR, 2008 p.530 a 533).
Com efeito, o fato é que os Direitos Humanos passa por um processo constante de afirmação e consolidação, sendo resultados de lutas travadas ao longo da história, necessitando constantemente a vontade política de sua efetivação.
Aliás, a aplicação e efetivação dos Direitos Humanos é, antes de tudo, um problema de ordem política e não filosófica, vez que depende da vontade dos governantes e das próprias pessoas.
Para melhor entender esse processo histórico de surgimento e evolução dos Direitos Humanos, impõe-se promover uma breve análise de suas gerações, sendo certo que restará evidente as razões de seus surgimentos em cada momento histórico.
2.3 GERAÇÕES
Serviram para desenvolver gerações de direito cada uma com suas especificações: direito de primeira geração relata os direitos civis e políticos, tendo em seu cunho a individualização do homem dentro de direitos e deveres; Na segunda geração a observação do surgimento dos direitos sociais; na terceira geração se encontra o direito de solidariedade; na quanta geração encontraremos a discussão da proteção à vida frente a engenharia genética, nesta linha corre o desenvolvimento deste pensamento através de gerações de direitos, que passa a ser conceituada historicamente. (LENZA, 2007 p.694).
Com efeito, em que pese a doutrina enquadrar/classificar os diferentes tipos de Direitos Humanos em gerações, o fato é que eles coexistem, não havendo que se falar em supressão de um com o surgimento do outro, haja vista que há uma complementação entre todos eles, justamente na busca da otimização da dignidade da pessoa humana.
Contudo, como dito acima, a doutrina classifica os Direitos Humanos em quatro gerações, gerações estas que serão analisadas a seguir.
2.3.1 1ª Geração de Direitos Humanos
Em síntese, os Direitos Humanos de primeira geração surgiram com a transposição do Estado Absoluto para o Estado Liberal, tendo em vista o contexto histórico-político da época, tendo como principal marco a Revolução Francesa.
Com efeito, na época do absolutismo os cidadãos não tinham previsto um catálogo de Direitos Humanos Fundamentais, ficando à mercê da vontade do soberano, até porque este reunia em si os poderes estatais (legislava, julgava e executava).
Isso trazia à sociedade a insegurança jurídica, inviabilizando o desenvolvimento das atividades comerciais da época, razão pela qual houve a insurgência da burguesia, justamente para ter maiores garantias individuais e participação política.
Foi quando surgiram os direitos humanos de primeira geração, quais sejam, os direitos civis e políticos, reforçando, justamente, o indivíduo contra as arbitrariedade do Estado.
Para melhor entendimento, merece transcrever os ensinamentos de Lenza a respeito dos Direitos Humanos de primeira geração, in verbis:
Direitos Humanos de primeira geração: alguns documentos históricos são marcantes para a configuração e emergência do que os autores chamam de direitos humanos de primeira geração (séculos XVII, XVIII e XIX): (1) Magna Carta de 1215, assinada pelo rei “João Sem Terra”; (2) Paz de Westfália (1648); (3) Hábeas Corpus Act (1679); (4) Bill of Rights (1688); (5) Declarações, seja a Americana (1776), ou a Francesa (1789). Mencionados direitos respeito às liberdades públicas e aos direitos políticos, ou seja, direitos civis e políticos a traduzirem o valor de liberdade; nesta motivação se analisa o conteúdo sócio jurídico que em primeiros passos ao longo da história encontra um implícito, conteúdo de liberdade do ser humano onde se afirma o gênesis do direito fundamental. ’ (LENZA, 2007 p.694).
Portanto, verifica-se que tais direitos serviram para se opor às arbitrariedades do Estado, possibilitando maiores garantias individuais e maior participação política, tendo como paradigma o princípio da liberdade – o Estado teria como função basicamente a segurança nacional –, além do próprio princípio da igualdade, só que meramente formal, perante a lei.
Contudo, o desenrolar da história, notadamente após a Revolução Industrial, essa situação de liberdade e igualdade formal mostrou que insuficiente para atender as necessidades sociais, razão pela qual passou a existir reivindicações populares direcionadas para o atendimento das necessidades sociais, surgindo, assim, os Direitos Humanos de segunda geração.
2.3.2 2ª Geração de Direitos Humanos
Os Direitos Humanos de segunda geração surgiram em decorrência da exigência de uma maior presença do Estado na realização das necessidades sociais, visando proporcionar, justamente, uma igualdade material (substancial) e não meramente forma.
O Estado passa a ter o dever de atuar de forma a minimizar as diferenças sociais, prevendo e garantindo direitos voltados para a realização das necessidades sociais, tais como Direito do Trabalho, Direito Previdenciário, segurança pública, transporte público, saúde, dentre outros.
Tais Direitos tiveram como marco normativo a Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição Alemã de 1919, tratando-se dos chamados Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, conforme explica Lenza:
Direitos Humanos de segunda geração: o momento histórico que os inspira e impulsiona é a Revolução Industrial européia, a partir de do século XIX. Neste sentido, em decorrência das péssimas situações e condições de trabalho, eclodem movimentos como o cartista – Inglaterra e a Comuna de Paris (1848), na busca de reivindicações trabalhistas e normas de assistência social. O início do século XX é marcado pela 1ª Grande Guerra e pela fixação de direitos sociais. Isso fica evidenciado, dentre outros documentos, pela Constituição de Weimar, 1919 (Alemanha), e pelo Tratado de Versalhes, 1919 (OIT). Portanto, os direitos humanos, ditos de segunda geração, privilegiam os direitos sociais, culturais e econômicos, correspondendo aos direitos de igualdade; (LENZA, 2007 p.694).
Portanto, tais direitos, diferente dos direitos humanos de primeira geração, serviram, e servem, para impor ao Estado uma conduta direcionada à realização das necessidade sociais básicas do cidadão, proporcionando a igualdade material.
2.3.3 3ª Geração de Direitos Humanos
Os direitos humanos de terceira geração, os chamados Direitos de Solidariedade, surgiram com o pós-segunda guerra mundial, marcando, justamente, a gênese do princípio da dignidade da pessoa humana na forma como é vista atualmente.
Com efeito, os Direitos Humanos de terceira geração surgiram em virtude dos avanços tecnológicos e do constante estado de beligerância que acabaram por desembocar na segunda guerra mundial, reduzindo o ser humano a objeto, fazendo surgir novas preocupações na comunidade internacional, conforme se pode extrair das palavras de Lenza:
‘Direitos Humanos de terceira geração: marcados pela alteração da sociedade, por profundas mudanças na comunidade internacional (sociedade de massa, crescente desenvolvimento tecnológico e científico), as relações econômico-sociais se alteram profundamente. Novos problemas e preocupações mundiais surgem, tais como a necessária noção de preservacionismo ambiental e as dificuldades para proteção dos consumidores, só para lembrar aqui dois candentes temas. O ser humano é inserido em uma coletividade e passa a ter direitos de solidariedade.’ (LENZA, 2007 p.694 e 695).
Portanto, verifica-se que tais direitos se preocupam mais com o âmbito macro do que individual, razão pela qual se tratam, como dito antes, de Direitos de Solidariedade ou difusos e coletivos.
2.3.4 4ª Geração de Direitos Humanos
Já os Direitos Humanos de quarta geração decorrem da globalização e da maior necessidade de participação política ativa dos cidadãos, além das próprias questões ligadas à biotecnologia, conforme expõe Lenza:
‘Direitos Humanos de quarta geração, segundo orientação de Norberto Bobbio, referida geração de direitos decorria dos avanços no campo da engenharia genética, ao colocarem em risco a própria existência humana, através da manipulação do patrimônio genético. Segundo o mestre italiano: “... já se apresentam novas exigências que só poderiam chamar-se de direitos de quarta geração, referentes aos efeitos cada vez mais traumáticos da pesquisa biológica, que permitirá manipulações do patrimônio genético de cada individuo”. (LENZA, 2007 p.695)
Portanto, verifica-se que as quatro gerações de Direitos Humanos surgiram em contextos históricos distintos, opondo-se às contingências postas à desafiar a sociedade, seja oriunda da conduta do Estado, seja da conduta oriunda de particulares, ora como oposição à paradigmas ideológicos vigentes, ora para barrar os reflexos negativos dos avanços tecnológicos atrelados à questões bélicos ou biológicas.
Além disso, da geração de Direitos Humanos pode-se extrair as suas funções, o que restará evidente, também, o arcabouço de proteção do ser humano.
2.4 FUNÇÕES
Observa-se que nas qualificações das gerações se encontra a função das mesmas que destacam-se “[...] a clássica concepção de matriz liberal portuguesa, os direitos fundamentais cumpriam, originalmente, tão somente a função de direito de defesa do indivíduo contra os abusos gerados pela atuação do Estado. (CUNHA JÚNIOR, 2008 p.525).
Assumindo essa linha de pensamento levam-se em consideração que desta forma se efetivou a legalidade da atuação do Estado sobre seus cidadãos, ou seja, todas as entidades estatais ficaram limitadas à atuação legal; só poderiam atuar dentro do que lhe fossem permitido por lei. Qualquer posicionamento contrário ensejava na ilegalidade das suas ações ferindo assim todos os diplomas legais vigentes na atualidade.
Aliás, todos os preceitos constitucionais, notadamente aqueles que tem natureza de Direitos Humanos Fundamentais, identificam-se, em si, as funções dos referidos direitos, haja vista as múltiplas funções que os mesmo exercem.
Nessa linha de raciocínio, são as palavras de Cunha Jr., in verbis:
Os direitos fundamentais exercem múltiplas funções na ordem jurídica. Isso se justifica não só pelo contexto histórico no qual os direitos fundamentais foram gestados – dando ensejo a falar-se em gerações ou dimensões de direitos (direito de liberdade, de igualdade, de solidariedade e de globalização política, que são, respectivamente, direitos de primeira, segunda, terceira e quarta dimensão), em face das quais cada um desempenha papel diversificado –, como também pela compreensão da dupla perspectiva subjetiva-objetiva desses direitos [...].
Com efeito, pode-se identificar quatro funções dos Direitos Humanos Fundamentais, quais sejam: a função de defesa, a função de prestação, a função de proteção contra terceiros e a função de não discriminação.
A função de prestação origina-se dos direitos humanos de segunda geração e divide-se em normativa e material. A função de prestação normativa diz respeito à atuação legislativa do Estado na produção de normas direcionadas ao atendimento das necessidades sociais, enquanto que a função de prestação material se trata das políticas públicas propriamente ditas.
Já a função de não discriminação, também ligada aos direitos humanos de segunda geração, trata-se da vedação ao Estado praticar condutas discriminatórias, assim como ao próprio particular.
Contudo, interessa mais de perto para o presente trabalho a função de defesa e a função de proteção contra terceiros. Esta última se trata da gênese da chamada eficácia horizontal dos Direitos Humanos Fundamentais, função esta que impõe ao Estado a proteção do ser humano em decorrência de investida de violação de um outro particular.
Já a função de defesa origina-se dos chamados direitos humanos de primeira geração, visando, justamente, proteger o ser humano enquanto sua individualidade, dividindo-se em três situações: direito ao não impedimento às ações do titular do direito fundamental; direito à não afetação dos bens jurídicos protegidos; e direito à não eliminação de posições jurídicas.
Quanto ao direito ao não impedimento às ações do titular do direito fundamental, explica Cunha Jr. (2010, p. 525):
Com esteio nesta função, os direitos fundamentais inibem que o Estado impeça ou obstaculize determinadas ações do titular do direito, correspondendo a um direito ao não impedimento às ações do titular do direito fundamental. Assim, não pode o Estado obstaculizar o exercício de liberdades franqueadas (como, v.g., criar censuras prévias para a manifestação da liberdade artística ou religiosa, cercear a liberdade de locomoção e o direito de reunião), nem criar condições desmedidas para o exercício de uma profissão.
Nas palavras de Cunha Jr. (2010, p. 525), quanto ao direito de não-afetação dos bens jurídicos protegidos, tem-se o seguinte:
[...] os direitos fundamentais de defesa tutelam os bens jurídicos fundamentais contra as ações positivas do Estado que os venham atentar. Nessa medida, em razão, por exemplo, dos direitos à vida e à privacidade, o Estado não pode afetar os bens jurídicos por esses direitos protegidos. Esses direitos a ações negativas apresentam-se como direitos a que o Estado não afete determinadas propriedades ou situações do titular do direito. Os direitos de defesa correspondem, aqui, a um direito à não-afetação dos bens jurídicos protegidos, ou seja, como chama Alexy, direitos à não afetação de propriedade e situações.
Por fim, quanto direito à não eliminação de posições jurídicas, leciona Cunha Jr. (2010, p.. 525):
Os direitos de defesa ainda compreendem o chamado direito à não-eliminação de posições jurídicas, que impede sejam eliminadas do sistema jurídico determinadas posições jurídicas concretas do titular do direito, como, por exemplo, o direito de propriedade, o matrimônio, etc.
Portanto, verifica-se que os Direitos Humanos Fundamentais e suas funções trazem um arcabouços de proteções jurídico-materiais que servem para otimizar a dignidade da pessoa humana, bem jurídico este que serve de tábua axiológica do ordenamento jurídico.
3 O TRABALHO DO POLICIAL MILITAR NA BAHIA
Encontra-se neste tópico descrito a função policial militar pautada na Constituição Federal e em seu Estatuto de 2001, que, através do Art. 38, narra tão grandiosa missão na garantia da proteção dos direitos individuais da pessoa humana.
E como no percurso das suas atividades ocorrem os desvios de suas atividades para favorecimentos de poucos, contrariando a legalidade constitucional de suas atribuições, se remetendo a práticas ilícitas, há também a descrição da disciplina militar, bem como a indisciplina e seu efeito.
Além disso, tem-se a questão da ética profissional pautada em valores morais que é o verdadeiro corporativismo, e quando o mesmo torna-se nocivo para a sociedade, comprometendo a imagem da instituição por causa de más profissionais perante a mesma e como o estresse dentro da profissão vem acabando com os profissionais e porque há tanto estresse nesta atividade.
3.1 FUNÇÕES DA POLICIA MILITAR
Na Carta Constitucional de 1988, ficou estabelecido que incumbem às Policias Militares as funções de defesa interna da nação através do policiamento ostensivo e a manutenção da ordem pública, conforme se pode extrair do art. 144, § 5ª, in verbis: “Art. 144. [...]. § 5º. Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública;” (BRASIL,2010).
Obtendo a titularidade de militares estaduais sob comando direto dos governos dos Estados, sendo cada uma regida por seus estatutos conforme seu Estado, sendo certo que a Policia Militar do Estado da Bahia (PMBA) tem seu Estatuto estabelecido pela Lei nº. 7.990 de 27 de dezembro de 2001, atualizadas pelas Leis 8.639 de 15 de julho de 2003 e a 10.957 de 02 de janeiro de 2008.
Conforme esse Estatuto, tem-se que em seu Art. 1º regula o ingresso, as situações institucionais, as obrigações, os deveres, direitos, garantias e prerrogativas dos integrantes da PMBA, podendo-se observar que a parte mais importante se encontra elencada em seu Art. 38, caput, e seus incisos, transcrito abaixo: (BAHIA, 2008, p.35)
Art. 38 - São manifestações essenciais dos valores policiais militares:
I - o sentimento de servir à sociedade, traduzido pela vontade de cumprir o dever policial militar e pelo integral devotamento à preservação da ordem pública e à garantia dos direitos fundamentais da pessoa humana;
II - o civismo e o respeito às tradições históricas;
III - a fé na elevada missão da Polícia Militar;
IV - o orgulho do policial militar pela Instituição;
V - o amor à profissão policial militar e o entusiasmo com que é exercida;
VI - o aprimoramento técnico-profissional.
Neste Art. 38, inciso I, ressalta sem sombra de duvidas a função da PMBA e seus membros, demonstrando que o policiamento ostensivo serve para a manutenção da ordem pública, sendo que o mais importante é a garantia e manutenção dos direitos individuais da pessoa humana, previsto no art. 5º da Carta Magna pátria, e demais tratados de direitos humanos em que o Brasil é signatário. (BAHIA, 2008, p.46)
Deste modo, torna-se evidente a essência da profissão policial militar, sendo, justamente, a proteção da vida de todos, independente de seus atos.
3.2 ATIVIDADES DESEMPENHADAS E SEUS DESVIOS
Observa-se diversas atividades da PMBA e por muitas vezes tendo um determinado desvio da função na conformidade definida no Art. 144, inciso V, que a segurança é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, pois conforme prevista na Constituição Federal, sua missão, na conformidade do § 5º do mesmo dispositivo legal, cabe a ela o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública.
Quando se fala em desvio da função do policial militar, não se trata de função atípica que qualquer entidade estatal exerce, como função administrativa, gestão financeira, ouvidoria e até mesmo corregedoria, por exemplo, e sim policiamento ostensivo em âmbito particular com as armas do Estado, passando as viaturas a servirem a interesses particulares, um individuo e não a coletividade, como prever a Magna Carta de 1988, salvo exceções que se dá com a manutenção da ordem pública que ocorre quando grupos para-militares ou facções criminosas ameaçam o devido Estado Democrático de Direito representado por suas autoridades devidamente constituídas. (BRASIL, 2010 p.52)
Onde há representatividade do poder emanada do povo e para o povo, só quando a harmonia constitucional é ameaçada cabe o uso da Policia Militar, para a manutenção da ordem pública na menção do texto constitucional.
Torna-se um abuso de poder quando uma guarnição que deveria estar fazendo o policiamento ostensivo fica guardando, por exemplo, a casa do comandante geral da PMBA, ou, ainda, sem qualquer motivo passa a fazer um policiamento ostensivo individual, que no texto constitucional seria coletivo, situações estas que, por vezes, se estendem para juízes, promotores de justiça deputados estaduais e federais, sem o amparo jurídico da CF/88, desviando assim um número grande de policiais do mais baixo ao mais alto escalão da PMBA.
Observa-se que as atividades constitucionais da Policia Militar não está na legalidade que prever a lei (BRASIL, 2010), ficando os cidadãos descobertos e pagando pelo serviço de segurança pública que não funciona na prática, acabando tendo que se socorrer com serviço de segurança particular.
Segundo Arrais (2010), “Os embriões dos grupos de extermínio nascem quando comerciantes e outros empresários recrutam matadores de aluguel, freqüentemente entre policiais militares, e civis, para o que chamam ‘limpar’ o ‘seu’ bairro ou sua cidade”.
Registre-se, também, que em muitos casos o cidadão acaba tendo que pagar uma milícia, que são, na verdade, força paralela às instituições democraticamente estabelecidas e em sua maioria composta por profissionais das instituições estatais, ganhando novamente para fazerem o que deveriam, agindo totalmente fora dos princípios legais.
Segundo Arrais (2010), “Não raro essas organizações ampliam seus leques de prática criminosas executando seqüestros, assaltos, narcotráfico e etc. Afinal, quem mata por dinheiro dificilmente terá limites morais para a prática de outros crimes”, destacando-se por sua crueldade, sendo certo que seu preparo militar permite assumir toda a localidade, passando a coagir aqueles que eram seus patrões, tornado-se reféns e vitimas de seus supostos salvadores.
Com efeito, tornando-se acima da lei e da ordem estabelecida, este grupo passa a legislar, julgar e executar aqueles que são tomados por suspeitos ou traidores da organização, sendo certo que aqueles que não pagam a taxa estipulada pelo grupo acaba assumindo a inadimplência com a própria vida.
Nesse contexto, acaba-se implantando a lei do silencio na comunidade, o que não é desrespeitadas, pois o custo seria a própria vida. Assim, pode-se constatar que quando o Estado se omite, não cumprindo com seu papel social, ocorrerá constantemente vidas perdidas sem qualquer motivo, ou seja, a banalização dos princípios constitucionais, ficando a Constituição somente no plano ideal, sem sua efetivação.
3.3 A DISCIPLINA MILITAR
No dicionário Aurélio (2001, p.239), o termo disciplina pode ser definido como “regime de ordem imposta ou livremente consentida: ordem que convém ao funcionamento regular de uma organização: relação de subordinação do aluno ao mestre ou ao instrutor, observância de preceitos ou normas: submissão a um regulamento”.
Verifica-se que o termo disciplina tem assumido ao longo do tempo diferentes significações: punição, dor, direção moral, regra de conduta para fazer reinar a ordem numa coletividade, obediência à regra. Há assim, uma disciplina familiar, como há uma disciplina militar, religiosa, desportiva, partidária, sindical, dentre outras. Portanto, as regras e leis são criadas pelas sociedades que através da cultura propaga os seus ensinamentos, formando atitudes e pensamentos de acordo com o grupo social existente.
Nesse contexto, constata-se que a disciplina é necessária para a convivência em sociedade, sendo que existem várias formas de concebê-la.
Segundo Estrela (1994 p.15): “O termo disciplina é susceptível de muitas interpretações que hoje tendem não apenas evocar as regras e a ordem delas decorrentes como as sanções ligadas aos desvios e o conseqüente sofrimento que elas originam”.
É necessário que as pessoas saibam que precisam de certa organização para viver em sociedade, compreendendo que se deve ter determinados limites. O cidadão tem direito e deveres a serem cumpridos para viver em harmonia. O desacato a essas normas constitui a indisciplina. As vertentes dadas ao conceito de disciplina e indisciplina se diferenciam pelo período histórico.
De acordo com Estrela (1994 p.15), O conceito de indisciplina relaciona-se intimamente com o de disciplina e tende normalmente a ser definida pela sua negação, privação ou pela desordem proveniente da quebra de regras estabelecidas.
La Taille, buscando definir a disciplina, reflete:
O que é disciplina? O que é sua negação indisciplina? Não é tão simples. Se entendermos por disciplina comportamentos regidos por um conjunto de normas, a indisciplina poderá se traduzir de duas formas: 1) a revolta contra essas normas; 2) o desconhecimento delas. No primeiro caso, a indisciplina traduz-se por uma forma de desobediência insolente; no segundo, pelo caos dos comportamentos, pela desorganização das relações. Aproveito para dizer que hoje o segundo caso parece-me valer. (1996 p.10)
Deste modo, toda e qualquer atividade atribuída ao serviço policial, não pautada na lei traz o caos da ilegalidade e suas mazelas ao seio da sociedade que deverá arcar solidariamente e não poderá se exonerar de tais atos, só cabendo reparação quando puder ser no todo ou em parte.
3.4 A ÉTICA PROFISSIONAL E O CORPORATIVISMO
Encontra-se a ética profissional bem definida no Estatuto Policial Militar, a qual todos deveriam buscar sua efetivação como se encontra, posto em seu Art. 39, principalmente no inciso III, que vem reforçar o respeito á dignidade da pessoa humana,
Muitos podem questionar se essa constante repetição não seria uma redundância, o que por certo, não é, tendo em vista as constantes condutas desviadas. Com efeito, até que poderia se considerar redundância se as pessoas andassem cumpridoras dos deveres, respeitando o próximo.
Contudo, o fato é que a população em geral pratica quase que completamente o contrario do que está posto na lei, não respeitando o próximo e querendo ser respeitado em relação aos direitos. Fere-se qualquer principio constitucional quando em uma abordagem a um cidadão um dos membros da guarnição o desrespeita ou o cidadão desrespeita o policial que estar trabalhando para a sua proteção, sendo certo que os direitos humanos nessas situações são destruídos, não observando-se, inclusive, os preceitos do art. 39 do Estatuto, in verbis:
Art. 39. O sentimento do dever, a dignidade policial militar e o decoro da classe impõem a cada um dos integrantes da Polícia Militar conduta moral e profissional irrepreensíveis, tanto durante o serviço quanto fora dele, com observância dos seguintes preceitos da ética policial militar:
I - amar a verdade e a responsabilidade como fundamento da dignidade pessoal;
II - exercer com autoridade, eficiência, eficácia, efetividade e probidade as funções que lhe couberem em decorrência do cargo;
III - respeitar a dignidade da pessoa humana;
IV - cumprir e fazer cumprir as Leis, os regulamentos, as instruções e as ordens das autoridades competentes, à exceção das manifestamente ilegais;
V - ser justo e imparcial no julgamento dos atos e na apreciação do mérito dos subordinados;
VI - zelar pelo preparo moral, intelectual e físico próprio e dos subordinados, tendo em vista o cumprimento da missão comum;
VII - praticar a solidariedade e desenvolver permanentemente o espírito de cooperação;
VIII - ser discreto em suas atitudes e maneiras e polido em sua linguagem falada e escrita;
IX - abster-se de tratar de matéria sigilosa, de qualquer natureza, fora do âmbito apropriado;
X - cumprir seus deveres de cidadão;
XI - manter conduta compatível com a moralidade administrativa;
XII - comportar-se educadamente em todas as situações;
XIII - conduzir-se de modo que não sejam prejudicados os princípios da disciplina, do respeito e do decoro policial militar;
XIV - abster-se de fazer uso do posto ou da graduação para obter facilidades pessoais de qualquer natureza ou para encaminhar negócios particulares ou de terceiros;
XV - abster-se, na inatividade, do uso das designações hierárquicas quando:
a) em atividade político-partidária;
b) em atividade comercial ou industrial;
c) para discutir ou provocar discussões pela imprensa a respeito de assuntos políticos ou policiais militares, excetuando-se os de natureza exclusivamente técnica, se devidamente autorizado;
d) no exercício de funções de natureza não policiais militares, mesmo oficiais.
XVI - zelar pelo bom conceito da Polícia Militar;
XVII - zelar pela economia do material e a conservação do patrimônio público.
Nesta visão não é demais ressaltar que a dignidade humana nunca é demais ser lembrada e respeitada, em todos seus aspectos, por mais simples que seja.
3.5 O ESTRESSE DENTRO DA PROFISSÃO
Na profissão exercida pelo policial militar, observa-se um alto nível de estresse, tendo em vista, justamente, essa guerra particular vivida constantemente, submetido em um alto nível de exigência sem trégua, considerando-se que, por ser policial militar, não pode errar.
Corroborando com as essas afirmações, o policial militar torna-se vitima de um sistema de trabalho, perverso, onde o integrante da PMBA que vive integralmente a função policial sem uma boa qualidade de vida, entrará em um circulo vicioso, pois o mesmo terá seu sistema alterado por não haver um relaxamento, tendo em vista que estará em vigilância constante mesmo fora do serviço.
Essa situação, essencialmente negativa para o policial militar, gera reflexos em sua conduta, o que passa a contrariar os valores morais da instituição que serve e da própria Constituição Federal de 1988, principalmente em relação aos seus direito fundamentais, que são dilacerados de todas as formas, causando reflexos negativos na forma de abordar o cidadão.
4 USO LEGÍTIMO DA FORÇA
4.1 A FORÇA EM SUAS MODALIDADES
Há uma legislação especifica para o uso legitimo da força, conforme está inserido na Resolução nº 34/169 da ONU (Organização das Nações Unidas), Código de Conduta para Policiais adotado no Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinqüentes realizado em Havana, Cuba, de 27 de Agosto a 7 de Setembro de 1990.
Especial atenção deve ser dada ao art. 2º da referida Resolução, pois diz que “no cumprimento do seu dever, os policiais devem respeitar e proteger a dignidade humana, manter e apoiar os direitos fundamentais de todas as pessoas”.
Merece destaque, também o que estabelece o art. 3º da mencionada Resolução, in verbis: “Os policiais só podem empregar a força quando tal se apresente estritamente necessário, e na medida exigida para o cumprimento do seu dever”.
Aliás, a força empregada pelo policial deve ser de acordo com a necessidade que o caso concreto impõe, devendo fazer uso da arma de fogo somente como último recurso, ou seja, quando for necessário.
Isso é o que se pode extrair do art. 8º da Resolução acima referida, in verbis:
ARTIGO 8.º
2. Os Governos e os organismos de aplicação da lei devem desenvolver um leque de meios tão amplo quanto possível e habilitar os policiais com diversos tipos de armas e de munições, que permitam uma utilização diferenciada da força e das armas de fogo. Para o efeito, deveriam ser desenvolvidas armas neutralizadoras não letais, para uso nas situações apropriadas, tendo em vista limitar de modo crescente o recurso a meios que possam causar a morte ou lesões corporais. Para o mesmo efeito, deveria também ser possível dotar os policiais de equipamentos defensivos, tais como escudos, viseiras, coletes anti-balísticos e veículos blindados, a fim de se reduzir a necessidade de utilização de qualquer tipo de armas.
4. Os policiais, no exercício das suas funções, devem, na medida do possível, recorrer a meios não violentos antes de utilizarem a força ou armas de fogo. Só poderão recorrer à força ou a armas de fogo se outros meios se mostrarem ineficazes ou não permitirem alcançar o resultado desejado.
5. Sempre que o uso legítimo da força ou de armas de fogo seja indispensável, os policiais devem:
a) Utilizá-las com moderação e a sua ação deve ser proporcional à gravidade da infração e ao objetivo legítimo a alcançar;
b) Esforçar-se por reduzirem ao mínimo os danos e lesões e respeitarem e preservarem a vida humana;
c) Assegurar a prestação de assistência e socorros médicos às pessoas feridas ou afetadas, tão rapidamente quanto possível;
d) Assegurar a comunicação da ocorrência à família ou pessoas próximas da pessoa ferida ou afetada, tão rapidamente quanto possível.
[...]
9 - Policiais não devem usar armas contra pessoas, exceto para se defender ou defender terceiros contra iminente ameaça de morte ou lesão grave, para evitar a perpetração de um crime envolvendo grave ameaça à vida, para prender pessoa que represente tal perigo e que resista à autoridade, ou para evitar sua fuga, e apenas quando meios menos extremos forem insuficientes para atingir tais objetivos. Nesses casos, o uso intencionalmente letal de arma só poderá ser feito quando estritamente necessário para proteger a vida.
Assim, da analise do referido documento pode-se notar que a PMBA tem andado na contra-mão da história, pois a mesma pratica o último recurso – utilização da arma de fogo – a todo o tempo, tornando-se o cotidiano do policial militar.
4.2 O USO DA FORÇA NA ATIVIDADE POLICIAL MILITAR: UM FOCO NA UTILIZAÇÃO DA ALGEMA
A palavra algema é originária do idioma arábico, al jamad e tem o significado de pulseira, no sentido de aprisionar, um instrumento empregado para impedir reações indevidas, incontroláveis ou agressivas por presos em relação aos policiais, contra si mesmo ou contra terceiros.
Quanto ao uso de algemas, diz Maria Elizabeth Queijo que só se admite “a contenção física de alguém, por meio de algemas, quando houver resistência, perigo de fuga, ameaça à vida ou à integridade física de terceiros”, acrescentando que “tal perigo não é presumido, devendo ser apurado objetivamente, a partir de informações que constem de registros policiais, judiciais ou mesmo do estabelecimento prisional”.
O artigo 199 da Lei de Execuções Penais remete a disciplina do uso de algemas a Decreto Federal – que ainda não existente –, restando a advertência de que as mesmas só podem ser utilizadas quando estritamente forem necessárias pelas circunstâncias, não podendo desmoralizar aqueles que são presos, principalmente quando for perante as câmeras ou nas audiências, sob pena de se caracterizar abuso de autoridade.
Registre-se que o uso de algemas deve ser excepcional e justificado por razões de cautela, quando houver risco à integridade física dos envolvidos no ato prisional (policiais, vitimas e aprisionados).
Justifica-se o estudo, por entender que a complexidade de uso de algemas pelo policial deve ser analisada como sendo o agente da lei um sujeito amparado pelo direito. Nesse caso, a discussão diz respeito à manutenção da integridade física do policial que em seu dia-a-dia de trabalho lida com transgressores da lei, sobretudo correndo riscos que a profissão lhe impôs.
Na atividade policial as algemas é um instrumento fundamental, por fazer parte de um conjunto mínimo de segurança que um policial deve ter ao exercer suas atividades.
As forças policiais são cobradas a agir em caso de situação em que um flagrante delito está sendo cometido. No Código de Processo Penal diz o artigo 301: “qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”.
Como se pode constatar, os agentes policiais são obrigados a agir em situação de flagrante, quando há possibilidade de ação e que não deixe o policial em desvantagem.
O uso da força deve ser evitado, salvo quando indispensável no caso de resistência ou tentativa de fuga do preso (artigo 284 do Código de Processo Penal). O uso desnecessário da força, ou excessos, pode caracterizar abuso de autoridade, lesões corporais, homicídio etc.
Antes da edição da Súmula Vinculante nº 11, alguns diplomas legais já traziam espécies de orientações a serem seguidas na utilização das algemas nas prisões de infratores e suspeitos. Mesmo não mencionando a expressão algema, o Código de Processo Penal trazia regulamentos que poderiam ser interpretados também para o uso legal desta, sem ferir a dignidade da pessoa humana. Podemos citar como exemplo o que dispõe o artigo 292 do Código de Processo Penal:
Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.
No artigo supracitado, em caso de uma resistência do conduzido, é possível a utilização dos meios necessários, não há alguma menção em algemas, mas induz que elas sejam fundamentais neste contexto, a fim de evitar um possível confronto corporal ou até mesmo envolvendo armas de fogo.
Assim, as algemas acabam por englobar o universo extenso do termo meios necessários, desde que sejam utilizadas como forma de conter uma agressão, resistência ou fuga, e não como meio de punição ou exposição pública contra qualquer pessoa.
Na situação de flagrante não se tem tempo para verificar se a situação se enquadra dentro de um desses preceitos ou não. Conter indiciados ou suspeitos serve para se evitar uma agressão ou uma tentativa de fuga. Não há como prever qual será a atitude de uma pessoa ao tomar conhecimento que está sendo detida e que pode levar a conseqüências piores. Assim, a utilização das algemas se faz necessária.
Pode-se registrar, também, que no caso de menor de idade ser detido em razão do cometimento de algum ato infracional, é aceitável a utilização das algemas na condução deste. A proibição da legislação versa no sentido de que os menores não podem ser transportados nos compartimentos fechados das viaturas policiais, sob alegação que tal procedimento violaria a dignidade do menor conduzido.
A Promotora de Justiça Selma Sauerbronn de Souza retrata o pensamento inequívoco que se deve ter em relação ao uso das algemas quando se tem menores envolvidos em uma ocorrência:
[...] Em face do vigente Diploma Menorista, perfeito o entendimento que o uso de algemas no adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional, deixou de ser uma regra geral, passando a ser conduta excepcional por parte da autoridade policial, seja civil ou militar, quando tratar-se de adolescente de altíssimo grau de periculosidade, de porte físico compatível a um adulto, e que reaja a apreensão. Algemá-lo, certamente, evitará luta corporal e fuga com perseguição policial de desfecho muitas vezes trágico para o policial ou para o próprio adolescente. Portanto, o policial que diante de um caso concreto semelhante ao narrado, optar pela colocação de algemas, na realidade estará preservando a integridade física do adolescente, e, por conseguinte, resguardando o direito à vida e à saúde, assegurados pela Constituição Federal, e como não poderia deixar de serem, direitos substancialmente, consagrados pelo ECA [...]
Nota-se que a utilização das algemas é relevante na função policial. Os abusos não devem ser cometidos e se ocorrerem deverão ser investigados e punidos nos termos da lei. É necessário estabelecer critérios que garantam a dignidade de quem for detido. Uma das principais queixas é quando há a presença da mídia no momento da detenção, isto faz com que o uso das algemas se torne um vexame e por isso é necessário que se evite esta exposição.
A algema é uma forma de neutralização da força, contenção e imobilização do delinqüente e não o emprego da força, devendo ser utilizada quando necessário.
O ato de algemar não é um constrangimento ilegal. Poderá sê-lo se procedido tão somente para filmagem e divulgação em rede nacional, o que sujeita o policial a sanções disciplinares.
A discussão quanto ao uso de algemas durante o julgamento perante o Tribunal do Júri, é alvo de constantes polêmicas e assunto ainda sem uma definição legal, já que elas impressionam os jurados, que podem ser influenciados diretamente, mesmo que de forma inconsciente. Como julgam de acordo com a íntima convicção, o prejuízo ao réu não tem como ser determinado. As algemas afrontam a dignidade do réu e a presunção de inocência, já que são símbolo da condenação, mesmo antes da sentença, podendo implicar até em nulidade do julgamento em plenário do Júri.
A Lei nº 11.689/09, dando nova redação ao artigo 474 do Código de Processo Penal, em seu § 3º diz que: “Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período que permanecer no plenário de júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes”.
É evidente que a proporcionalidade é da essência do ato, devendo estar devidamente justificada e se fazer constar do termo de audiência. O arbítrio pode ser suscitado em preliminar de futura apelação, ensejando nulidade do julgamento.
Segundo STF e o STJ, o uso de algemas no Júri não constitui constrangimento quando for necessária à ordem dos trabalhos e à segurança dos presentes.
O STF na apreciação do HC nº 91.952 (Plenário – Rel. Min. Marco Aurélio – j. 07.08.08 – votação unânime), anulou o julgamento em plenário do júri, de um pedreiro que permaneceu algemado durante a sessão, acusado de homicídio na cidade de Laranjal Paulista, sob o fundamento de ter ocorrido potencial influência perante os jurados, não havendo demonstração de que tal expediente fosse necessário no caso concreto.
O uso de algemas tem caráter excepcional. Com base nesse entendimento, o Tribunal concedeu habeas corpus — impetrado em favor de condenado à pena de 13 anos e 6 meses de reclusão pela prática dos crimes previstos no art. 121, § 2º, II, III e IV, do CP, e no art. 10, da Lei 9.437/97 — para tornar insubsistente a decisão do Tribunal do Júri, e determinar que outro julgamento seja realizado, com a manutenção do acusado sem as algemas. Na espécie, o paciente permanecera algemado durante toda a sessão do Júri, tendo sido indeferido o pedido da defesa para que as algemas fossem retiradas, ao fundamento de inexistência de constrangimento ilegal, sobretudo porque tal circunstância se faria necessária ao bom andamento dos trabalhos, uma vez que a segurança, naquele momento, estaria sendo realizada por apenas dois policiais civis, e, ainda, porque o réu permanecera algemado em todas as audiências ocorridas antes da pronúncia.
A Súmula Vinculante nº 11 advém dos habeas corpus nº 84.429 e nº 91.952. O primeiro diz respeito à prisão em flagrante efetuada pela Polícia Federal em que os ministros concluíram que foi exposta desnecessariamente a imagem do acusado. Já o segundo trata da anulação do Tribunal do Júri que tratamos acima.
Menciona a recente Súmula Vinculante de nº 11, do Supremo Tribunal Federal, nos seguintes termos:
Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.
Em face da edição do enunciado da súmula vinculante sobre o uso de algemas, especialmente levando em consideração que o Código de Processo Penal Militar, em seu artigo 234, prevê que “o emprego de força só é permitido quando indispensável, no caso de desobediência, resistência ou tentativa de fuga”, podendo ser usados, se houver resistência da parte de terceiros, “os meios necessários para vencê-la ou para defesa do executor e auxiliar seus, inclusive a prisão do ofensor”, lavrando-se, de tudo, auto subscrito pelo executor e por duas testemunhas”. No parágrafo primeiro daquele dispositivo, está dito que “o emprego de algemas deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de agressão da parte do preso, e de modo algum será permitido, nos presos a que se refere o artigo 242”. A parte final desse dispositivo, ao vedar o uso de algemas em determinadas autoridades e portadores de diploma de curso superior, afigura-se uma não isonomia, por não se compatibilizar com o sistema constitucional. Entretanto, a primeira parte do texto normativo indica os limites para o uso de algemas e se ajusta aos ditames da Constituição Federal.
Cabe ressaltar não serem atendidos os requisitos para a edição da própria súmula vinculante, ou seja, para que se justificasse a emissão da súmula vinculante sobre o uso de algemas.
Seria necessário que existissem reiteradas decisões sobre a matéria constitucional, versando sobre a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais houvesse controvérsia atual entre os órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarretasse grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica, nos termos do artigo 103-A, § 1º, da Constituição Federal.
Ao que parece a edição da citada Súmula veio contextualizada, houve inúmeros excessos em atos prisionais espetaculosos, com objetivos nitidamente institucionais, a merecer a reprimenda e o controle do Poder Judiciário.
O Superior Tribunal de Justiça, em acórdão do Ministro José Arnaldo da Fonseca, entendeu que:
O uso de algemas há de ser aferido em cada caso concreto, não podendo haver decisum amplo, coibindo-o. Dentro dessa linha, parece-me mais sensato deixar a cargo da autoridade condutora do réu o melhor caminho a seguir, desde que não sejam tomadas providências desnecessárias e inconseqüentes, demonstradas por sinal no presente caso”. (STJ, 5ª Turma, HC 35.540, publicado DJ em 06.09.2004).
Confira-se outra decisão do STJ:
Uso de algemas. Avaliação da necessidade – A imposição do uso de algemas ao réu, por constituir afetação aos princípios de respeito à integridade física e moral do cidadão, deve ser aferida de modo cauteloso e diante de elementos concretos que demonstrem a periculosidade do acusado. Recurso provido”. (RHC nº 5.663 – SP, 6ª Turma, j. 19.87.1996, rel. Min. William Patterson, v.u., DJU 23.9.1996, pág. 35.157).
Destarte, vê-se que o magistrado não deve ficar limitado apenas aos ditames da referida súmula, mas exercer o poder de polícia dentro da sala de audiência, devendo zelar pela ordem dos trabalhos e segurança dos presentes.
Constata-se, portanto, que a utilização da força, notadamente no que toca à arma de fogo, somente deverá ocorrer se realmente for necessário, o mesmo ocorrendo em relação ao uso das algemas, justamente por proteção aos direitos fundamentais do cidadão, não deslegitimando a conduta do policial militar..
Aliás, visando, justamente, aproximar a polícia militar e a população, viabilizando o policiamento preventivo e o respeito dos direitos fundamentais, é que criou-se a chamada polícia comunitário, também denominada de polícia cidadã.
4.3 A POLÍCIA CIDADÃ DO ESTADO DA BAHIA
A Polícia Comunitária surge, na Bahia, sob o signo de Polícia Cidadã, que nasceu do Projeto Polícia Cidadã desenvolvido, na década de 1990, pela Polícia Militar da Bahia em conjunto com a Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia. A finalidade da Polícia Cidadã é criar uma nova política de policiamento que prioriza a prevenção através da participação comunitária, afastando-se das formas tradicionais de policiamento repressivo que criou uma barreira entre a polícia e o cidadão.
Registre-se que se trata de um projeto elaborado pela UFBA em conjunto com a PMBA, projeto este que sérvio para se buscar a melhor solução técnica na gestão administrativa.
Contudo, o fato é que na pratica os resultados mostrados não retratam o alcance dos objetivos almejados pelos mentores do projeto, tendo em vista o aumento da criminalidade e da alta taxa de homicídios, conforme demonstra o gráfico a seguir:
Assim, nessa conjuntura política a população, infelizmente, vem realizando justiça com as próprias, mãos visto que deste modo conturbado é mais efetivo e célere.
4.4. RESPEITO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A LEGITIMIDADE DA ATIVIDADE POLICIAL
Encontra-se consolidado a dignidade da pessoa humana na Constituição Federal de 1988 promulgada em 5 de Outubro do mesmo ano. Esse instituto é o pilar constitucional que garante todos os direitos fundamentais, individuais e coletivos não cabendo qualquer retrocesso de nenhuma ordem. Encontra-se positivado em seu Art. 1º que determina a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Município e Distrito Federal, constitui em um Estado Democrático de Direito e tem como fundamento a soberania; a cidadania; a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e o pluralismo político. E para a sua complementação encontramos o parágrafo único do mesmo artigo que determina que todo o poder emana do povo que o exerce por meio de representante eleitos ou diretamente nos termos desta Constituição. (BRASIL, 2010 p.7)
Observando a norma constitucional, deve-se destacar a importância do novo sentido de interpretação dos diplomas legais que é agora a interpretação constitucionalista que fragmenta o instituto da dignidade da pessoa humana em vários sentidos: Direito a vida, a igualdade, a liberdade, liberdade de ação, de locomoção, de opinião ou pensamento, de expressão intelectual, artística, científica e de comunicação, o direito de informar e ser informado, o direito da crítica jornalística, liberdade da ciência e da crença, liberdade de reunião.
Registre-se, ainda, a liberdade de associação, liberdade de opção profissional, direito a privacidade, direito à intimidade, direito a vida privada, direito a honra e a imagem, direito a inviolabilidade da casa, direito ao sigilo de correspondências e de todos os tipos de comunicações, direito de propriedade, direito a propriedade intelectual, direito a segurança em matéria penal e processual que deverão observar o devido processo legal garantindo o contraditório e a ampla defesa e dentre outros, sendo que nessa observância os direitos fundamentais não são mais restritivos e sim “erga omnes” (CUNHA JÚNIOR, 2008, p.635 - 678)
5 CONCLUSÃO
Constata-se que a indisciplina na atividade policial deve ser analisada em diferentes perspectivas, pois diversos fatores contribuem para a sua manifestação, ela está relacionada a problemas sociais, econômicos, culturais A priori devem-se investigar suas razões para então buscar alternativas que ajudem a amenizar a questão.
A sociedade, da forma em que está organizada, obriga os policiais militares a se ausentarem do lar por um longo período, eximindo-se do convívio familiar, deixando uma enorme lacuna para o uso de drogas licitas ou até mesmo as ilícitas provocando a desagregação familiar muitas vezes com o seu termino gerando graves problemas sociais. Constata-se que muitas policiais ficam na ociosidade, sem qualquer tipo de atividade física ou vão fazer bicos na sua folga para complementar a rendar familiar, ficando tão estressados que reverte isso para a família e para a sociedade, agindo de forma violenta.
É dizer: vai incentivar seu comportamento indisciplinado, refletindo falhas nos processos de conduta profissional, que vai atingir a quem deveria proteger, sendo o cidadão sua principal vitima assim como no âmbito familiar.
Percebe-se que uma parcela dos profissionais age desta forma, por não ter uma visão crítica e reflexiva da sua prática pensam que estão de acordo com a legalidade.
Do mesmo modo que os nazistas se conduziram, não sabem distinguir um comportamento indisciplinado de uma dificuldade de aprendizagem, atribuindo a origem da indisciplina ao cidadão que o desrespeitou ou de sua família que não te obedecem como se sua casa fosse uma extensão do quartel. É fundamental o desenvolvimento de atividades dinâmicas, lúdicas e adequadas às características de cada um e a sua faixa etária.
Assim, deve-se aproveitar o conhecimento prévio, promovendo a troca de informações, tentando aproximar o conhecimento à sua realidade, buscando um planejamento dessas atividades para não deixar espaço vago para o aparecimento da inversão de comportamento retirando sua agressividade exercida dentro do âmbito profissional ou familiar.
Em relação aos profissionais da policia militar, uma das causas da indisciplina é a falta de entendimento das leis e a internalização dos valores que estão em crise na sociedade atual.
É notória a necessidade e a importância de criar um elo entre a família e a vida profissional, possibilitando-se, assim, a orientação dos policiais para o cumprimento das leis, respeitando seus limites com profissional da policia militar.
E aos limites e regras impostas ajudam o respeito dos direitos individuais de cada ser, possibilitando o aprendizado no sentido de se respeitar as regras e limite social necessárias ao desenvolvimento que a autonomia profissional requer.
Foi nítida a percepção de que o militarismo não está preparado para receber a nova clientela, que por ser heterogênea, traz informações diversificadas que muitas vezes não são aproveitadas na para a construção de uma saciedade mais justa, por falta de habilidades do policial militar a trabalhar esse tipo de diferenças estabelecidas na constituição, com esse tipo de conhecimento.
Para construir um ambiente de harmonia na sociedade, convém que as regras sejam coerentes, construídas com a colaboração dos profissionais que realmente convivem com as mazelas da população, havendo entrosamento, divisão de responsabilidades e cooperação. É importante que o policial seja humano, porém firmes, seguros e convictos em seus posicionamentos e ao mesmo tempo amorosos e flexíveis dentro da legalidade atribuída pela profissão, transmitindo uma imagem de autoridade e não de autoritarismo.
Força, palavra derivada do latim que significa toda faculdade de operar ou de remover, cujas ações se dizem poder, esforço, vigor, energia e violência. Como entendido, encontra-se em várias ramificações e formas dentro do vocábulo e na sociedade, mas a que interessa é a força policial, pois está investida de poder enérgico que, na atualidade encontra-se revestida em outra fase as violências descabidas, desvirtuando o sentido da ação legitimada que esse instituto fornece.
Sendo a polícia detentora de tal instituto que a sociedade lhe atribui por meio do Estado Democrático de Direito e dentre as instituições, a Polícia Militar do Estado da Bahia é uma das mais antigas, com mais de 180 anos de história, e, neste percurso, observam-se muitos entrelaces na confusão de sua missão e no desvirtuamento de seu poder de polícia ou força policial na abordagem ao cidadão, sendo desproporcional aos meios utilizados.
Deste modo, atingindo a dignidade da pessoa humana, ferindo a Magna Carta e os direitos humanos, neste momento encontra-se o discurso na área da segurança pública o caminho da legalidade e qual a linha tênue para a ilegalidade na abordagem policial.
O presente trabalho monográfico tem como proposta apresentar um questionamento mais aprofundado da atividade policial militar no excesso de força contemplada na abordagem policial ao cidadão baiano, consolidando assim uma violação dos direitos humanos.
Considerando-se o novo contexto histórico vivido pelo povo brasileiro com o advento da Constituição Federal de 05 de outubro de 1988, surge o interesse por esse tema devido ao conflito do velho modelo de polícia criado na época da ditadura militar e assumido pela nova ordem constitucional, pois ao longo desses 21 anos de democracia, pouco foi feito para evolução da Policia Militar baiana (PMBA).
A polícia que cuidaria diretamente da proteção ao cidadão e reprimia o cidadão infrator dentro do que está previsto na Constituição Federal, hoje é a face e semelhança do militarismo de outrora, com homens preparados para o combate e não para lidar com as infrações penais, agindo sem distinguir o cidadão de bem dos seres humanos que se encontram à margem da lei, tudo em benefício de uma classe dominante.
Assim surge o seguinte problema: em que situações a Polícia Militar do Estado da Bahia apresenta casos de excesso de força policial na abordagem do cidadão baiano, a partir da Constituição Federal de 1988?
Deste modo, busca-se como objetivo geral, identificar em quais situações a Polícia Militar do Estado da Bahia apresenta casos de excesso de força policial na abordagem do cidadão baiano, a partir do advento Constitucional de 1988. Para cooperar com o estudo devem-se detalhar objetivos os específicos:
a) identificar o que é uso legitimo da força;
b) identificar como o violento estresse psicológico ao qual o policial militar é submetida influencia no excesso de força policial na abordagem;
c) observar se a condição de policial militar retira do ser a condição de cidadania;
d) verificar como o corporativismo macula a ética profissional;
e) verificar como a instituição Policial Militar do Estado da Bahia exerce controle e disciplina os policiais militares quando infringem os direitos humanos dos cidadãos pelo excesso de força policial na abordagem;
Na nova ordem constitucional, surge um horizonte novo a ser alcançado que é a dignidade humana, não cabendo a repressão contra a vida e a liberdade do ser, tolhida antes pelos ditames da ditadura militar.
Nesta visão, por meio das instituições democráticas reformuladas pela nova Constituição, após 21 anos de democracia, observa-se que as instituições policiais militares, que deveriam estar a serviço do povo, encontram-se desvirtuadas de suas funções, quando se utilizam indevidamente da força policial para atingir quaisquer outros meios, principalmente na abordagem policial agredindo a quem deveria proteger.
Desta forma, consoante a história tem demonstrado, a polícia tem o significado na semântica da expressão perfeição social, mas encontra a veredar em sentido oposto.
O presente estudo visa identificar e tentar sugerir resgatar pontos da instituição, para que evolua dentro do Estado Democrático do Direito, sendo a força o último recurso a ser utilizado pelos seus integrantes, principalmente a força letal e, ainda mais, em uma abordagem policial.
Pode-se observar que a fundamentação teórica será embasada na linha de pensamento de vários doutrinadores dentre eles Piovesan (2007), Carnelutti (2008), Cunha Júnior (2008), Greco (2009), Hobbes (2008) e outros, como se trata de uma problemática pouco explorada dentro do ramo do direito e, além disso, de uma notória complexidade, mostra-se oportuno situá-la teoricamente.
Para tanto, foi de fundamental importância a realização de uma pesquisa bibliográfica, por meio da qual, seguindo uma orientação teórica bem consistente e apropriada à temática, ficaram evidentes as posições ocupadas pela PMBA frente aos conceitos mais relevantes para o estudo, quais sejam: a ideologia do uso indiscriminado da força contra na sociedade em beneficio do Estado.
Posteriormente, após ter exposto algumas possíveis contradições teóricas, considera-se cientificamente prudente empreender um estudo aprofundado que possa interagir ou até mesmo contradizer os primeiros escritos.
O recurso metodológico visou a delimitação das contradições do papel da PMBA como servindo ao Estado em vez da sociedade, no aspecto do excesso da força na abordagem policial militar, levantado, ainda, o aspecto sobre as possíveis implicações objetivas destas contradições da instituição policial, tanto para os cidadãos quanto para os policiais militares.
Em uma concepção histórica, a construção da ideológica militar que delimita as funções das instituições que marcam os modos de pensar, sentir e agir das pessoas que as compõem e, também, daqueles que delas se servem.
Desse modo, alguns elementos foram analisados, a fim de legitimar o propósito do trabalho: ideologia da instituição PMBA braço forte do Estado em detrimento da sociedade e no abuso do poder constituído. A análise realizada teve arrimo nos posicionamentos doutrinários esboçando os conceitos de tais elementos.
Por meio do estudo dos conceitos supracitados, objetivou-se compreender os aspectos históricos, culturais, sociais e políticos que levam a idéia de que a PMBA serve ao Estado e não a sociedade em comum.
Da análise sobre o conceito de sociedade, discuti-se a respeito da estrutura e da dinâmica social especialmente caracterizada pela divisão do poder na estrutura organizacional do Estado e seus membros e sobre a repercussão dessa divisão para atividade policial militar no uso da força. Enfim, ainda a partir da crítica marxista, a discussão sobre Estado mostrou-se fundamental, uma vez que a PMBA é uma instituição estatal e, portanto, como funções dessa natureza podem refletir no Estado Democrático de Direito no desempenho das atividades da PMBA em momento histórico, vivido nessa era.
O universo a ser pesquisado neste projeto é a relação entre o uso da força policial na abordagem e os direitos humanos após a Constituição de 1988, que define o estado democrático de direto.
Foram analisados artigos publicados e livros relacionados com o desenvolvimento democrático das instituições policiais militares no uso legitimado da força e aplicação efetiva dos direitos humanos em benefício do cidadão baiano. São análises de conteúdo buscando a semelhança com os artigos de outros profissionais.
No momento inicial desta monografia, discute-se o uso legítimo da força, bem como a sua proporção exercida e quando esta deve ser realmente aplicada com o fim de se estabelecer o seu uso dentro da legalidade ou quando se configura ato ilícito; a realidade da policia cidadã dentro do Estado da Bahia e realmente qual a sua eficiência.
No momento posterior, é discutido o trabalho do policial militar da Bahia e sua atividade laboral desempenhada, assim como observar se há desvio de função, como se dá a disciplina militar e qual a sua eficácia no Estado Democrático de Direito. De igual forma, é analisada, neste momento, a ética profissional e o corporativismo quando atos criminosos passam a ser protegidos, discutindo-se, ademais, se isso é ético ou um falso corporativismo, o estresse psicológico dentro da atividade policial militar, quando isso ocorre e a forma como afeta os cidadãos, o próprio policial e sua família.
E, finalmente, discute-se a conclusão, abordando algumas correntes doutrinárias e possíveis contradições teóricas, pois o assunto é inquestionavelmente revestido de polêmica, haja vistas aos constantes casos noticiados pela imprensa.
Deste modo, examina-se uma discussão entre a problemática e a análise sobre a mesma e no decorrer desse trabalho monográfico depara-se com diversos pensamentos de discursos filosóficos e científicos de vários autores no qual o tema não se esgota, sendo sempre atual.
2 TEORIA GERAL DOS DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS
Entre as constituições de 1824 a 1988 passa por vários períodos históricos onde há construção dos direitos fundamentais do ser humano que finalmente consolida, com o principio constitucional da dignidade da pessoa humana que rege história atualmente, não cabendo qualquer retrocesso a tempos de leis draconianas. ‘Basta, por ora, que essa multifuncionalidade dos direitos fundamentais seja examinada à luz da clássica, mas atual, teoria do status de Georg Jellinek, e por algumas considerações acerca das funções de defesa, de prestação, de proteção perante terceiros e de não discriminação dos direitos fundamentais. ’
Nesta visão à construção do conceito de direitos humanos se solidifica em um cenário sócio-jurídico na totalidade atual. (CUNHA JÚNIOR, 2008 p.522).
2.1 CONCEITO
O desenvolvimento do conceito único cabe aos diversos tratados internacionais as quais o Brasil é consignatário de todos os acordos em prol da vida do ser humano ‘[...] concluímos que os direitos fundamentais são todas aquelas posições jurídicas favoráveis às pessoas que explicitam, direta ou indiretamente, o principio da dignidade humana, que se encontram reconhecidas no texto da Constituição formal (fundamentalidade formal) ou que, por seu conteúdo e importância, são admitidas e equiparadas, pela própria Constituição, aos direitos que esta formalmente reconhece, embora dela não façam parte (fundamentalidade material)’ conforme esse pensamento edifica-se um conceito moderno no desenvolvimento dos direitos humanos no entendimento desse trabalho monográfico (CUNHA JÚNIOR, 2008 p.520).
Em outras palavras, os Direitos Humanos Fundamentais se tratam de direitos surgidos ao longo da história em virtude do aparecimento de contingências, caracterizando-se, justamente pelas lutas travadas ou contra as arbitrariedades do Estado ou contra as próprias condutas praticadas por particulares.
Tratam-se de direitos que servem para se opor às condutas arbitrárias do Estado, bem como para exigir do ente estatal comportamentos direcionados à realização das necessidades sociais, tendo como norte a otimização do princípio da dignidade da pessoa humana.
Tais direitos são considerados fundamentais justamente por serem essenciais à condição humana, essenciais à convivência humana e por servirem de pilar ético-jurídico-político para justificar o impedimento de condutas praticadas pelo Estado, bem como a imposição de políticas públicas voltadas para a realização das necessidades sociais (Dirley, 2010, pp. 518-519).
Portanto, tratam-se de direitos essenciais ao ser humano, sem os quais o mesmo não se realizam, não se perfaz enquanto pessoa.
Como dito acima, os Direitos Humanos surgem ao longo da história, variando no tempo e no espaço, tendo em vista as diferentes contingências e necessidades surgidas em cada momento e em diferentes contextos, razão pela qual impõe-se, a seguir, promover uma breve análise da evolução histórica dos mesmos, bem como analisar as gerações.
2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA
A evolução histórica dos direitos humanos fundamentais surge a partir da necessidade de sobrevivência, da humanidade e da sua proteção, nesta concepção. [...] A compreensão histórica dos direitos fundamentais, portanto, exerce um papel extraordinariamente importante, pois permitem verificar a variedade de condições de realização dos direitos do homem, dentro da unidade do gênero humano, as experiências em confronto, ora de sedimentação, ora de crise e a descoberta de novos percursos e novos avanços.
Segundo essa linha de pensamento, evoluiu pouco em 21 anos de democracia os direitos humanos e sua efetivação em passos de milímetros, mais argumenta a dizer que apesar da lentidão histórica há uma constância no processo evolutivo.
E dentro das constantes evoluções, vários abusos físicos a partir de tortura em todos os âmbitos com a desvalorização da vida e com sua moral atingida também com a pior das barbáries humanas a destruição do ser pelo seu psicológico. Pois ocorre em sentido subjetivo que se denomina também tortura, mas que só marca a alma do ser humano que dificilmente retornará a seu “status quo ante” (CUNHA JÚNIOR, 2008 p.530 a 533).
Com efeito, o fato é que os Direitos Humanos passa por um processo constante de afirmação e consolidação, sendo resultados de lutas travadas ao longo da história, necessitando constantemente a vontade política de sua efetivação.
Aliás, a aplicação e efetivação dos Direitos Humanos é, antes de tudo, um problema de ordem política e não filosófica, vez que depende da vontade dos governantes e das próprias pessoas.
Para melhor entender esse processo histórico de surgimento e evolução dos Direitos Humanos, impõe-se promover uma breve análise de suas gerações, sendo certo que restará evidente as razões de seus surgimentos em cada momento histórico.
2.3 GERAÇÕES
Serviram para desenvolver gerações de direito cada uma com suas especificações: direito de primeira geração relata os direitos civis e políticos, tendo em seu cunho a individualização do homem dentro de direitos e deveres; Na segunda geração a observação do surgimento dos direitos sociais; na terceira geração se encontra o direito de solidariedade; na quanta geração encontraremos a discussão da proteção à vida frente a engenharia genética, nesta linha corre o desenvolvimento deste pensamento através de gerações de direitos, que passa a ser conceituada historicamente. (LENZA, 2007 p.694).
Com efeito, em que pese a doutrina enquadrar/classificar os diferentes tipos de Direitos Humanos em gerações, o fato é que eles coexistem, não havendo que se falar em supressão de um com o surgimento do outro, haja vista que há uma complementação entre todos eles, justamente na busca da otimização da dignidade da pessoa humana.
Contudo, como dito acima, a doutrina classifica os Direitos Humanos em quatro gerações, gerações estas que serão analisadas a seguir.
2.3.1 1ª Geração de Direitos Humanos
Em síntese, os Direitos Humanos de primeira geração surgiram com a transposição do Estado Absoluto para o Estado Liberal, tendo em vista o contexto histórico-político da época, tendo como principal marco a Revolução Francesa.
Com efeito, na época do absolutismo os cidadãos não tinham previsto um catálogo de Direitos Humanos Fundamentais, ficando à mercê da vontade do soberano, até porque este reunia em si os poderes estatais (legislava, julgava e executava).
Isso trazia à sociedade a insegurança jurídica, inviabilizando o desenvolvimento das atividades comerciais da época, razão pela qual houve a insurgência da burguesia, justamente para ter maiores garantias individuais e participação política.
Foi quando surgiram os direitos humanos de primeira geração, quais sejam, os direitos civis e políticos, reforçando, justamente, o indivíduo contra as arbitrariedade do Estado.
Para melhor entendimento, merece transcrever os ensinamentos de Lenza a respeito dos Direitos Humanos de primeira geração, in verbis:
Direitos Humanos de primeira geração: alguns documentos históricos são marcantes para a configuração e emergência do que os autores chamam de direitos humanos de primeira geração (séculos XVII, XVIII e XIX): (1) Magna Carta de 1215, assinada pelo rei “João Sem Terra”; (2) Paz de Westfália (1648); (3) Hábeas Corpus Act (1679); (4) Bill of Rights (1688); (5) Declarações, seja a Americana (1776), ou a Francesa (1789). Mencionados direitos respeito às liberdades públicas e aos direitos políticos, ou seja, direitos civis e políticos a traduzirem o valor de liberdade; nesta motivação se analisa o conteúdo sócio jurídico que em primeiros passos ao longo da história encontra um implícito, conteúdo de liberdade do ser humano onde se afirma o gênesis do direito fundamental. ’ (LENZA, 2007 p.694).
Portanto, verifica-se que tais direitos serviram para se opor às arbitrariedades do Estado, possibilitando maiores garantias individuais e maior participação política, tendo como paradigma o princípio da liberdade – o Estado teria como função basicamente a segurança nacional –, além do próprio princípio da igualdade, só que meramente formal, perante a lei.
Contudo, o desenrolar da história, notadamente após a Revolução Industrial, essa situação de liberdade e igualdade formal mostrou que insuficiente para atender as necessidades sociais, razão pela qual passou a existir reivindicações populares direcionadas para o atendimento das necessidades sociais, surgindo, assim, os Direitos Humanos de segunda geração.
2.3.2 2ª Geração de Direitos Humanos
Os Direitos Humanos de segunda geração surgiram em decorrência da exigência de uma maior presença do Estado na realização das necessidades sociais, visando proporcionar, justamente, uma igualdade material (substancial) e não meramente forma.
O Estado passa a ter o dever de atuar de forma a minimizar as diferenças sociais, prevendo e garantindo direitos voltados para a realização das necessidades sociais, tais como Direito do Trabalho, Direito Previdenciário, segurança pública, transporte público, saúde, dentre outros.
Tais Direitos tiveram como marco normativo a Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição Alemã de 1919, tratando-se dos chamados Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, conforme explica Lenza:
Direitos Humanos de segunda geração: o momento histórico que os inspira e impulsiona é a Revolução Industrial européia, a partir de do século XIX. Neste sentido, em decorrência das péssimas situações e condições de trabalho, eclodem movimentos como o cartista – Inglaterra e a Comuna de Paris (1848), na busca de reivindicações trabalhistas e normas de assistência social. O início do século XX é marcado pela 1ª Grande Guerra e pela fixação de direitos sociais. Isso fica evidenciado, dentre outros documentos, pela Constituição de Weimar, 1919 (Alemanha), e pelo Tratado de Versalhes, 1919 (OIT). Portanto, os direitos humanos, ditos de segunda geração, privilegiam os direitos sociais, culturais e econômicos, correspondendo aos direitos de igualdade; (LENZA, 2007 p.694).
Portanto, tais direitos, diferente dos direitos humanos de primeira geração, serviram, e servem, para impor ao Estado uma conduta direcionada à realização das necessidade sociais básicas do cidadão, proporcionando a igualdade material.
2.3.3 3ª Geração de Direitos Humanos
Os direitos humanos de terceira geração, os chamados Direitos de Solidariedade, surgiram com o pós-segunda guerra mundial, marcando, justamente, a gênese do princípio da dignidade da pessoa humana na forma como é vista atualmente.
Com efeito, os Direitos Humanos de terceira geração surgiram em virtude dos avanços tecnológicos e do constante estado de beligerância que acabaram por desembocar na segunda guerra mundial, reduzindo o ser humano a objeto, fazendo surgir novas preocupações na comunidade internacional, conforme se pode extrair das palavras de Lenza:
‘Direitos Humanos de terceira geração: marcados pela alteração da sociedade, por profundas mudanças na comunidade internacional (sociedade de massa, crescente desenvolvimento tecnológico e científico), as relações econômico-sociais se alteram profundamente. Novos problemas e preocupações mundiais surgem, tais como a necessária noção de preservacionismo ambiental e as dificuldades para proteção dos consumidores, só para lembrar aqui dois candentes temas. O ser humano é inserido em uma coletividade e passa a ter direitos de solidariedade.’ (LENZA, 2007 p.694 e 695).
Portanto, verifica-se que tais direitos se preocupam mais com o âmbito macro do que individual, razão pela qual se tratam, como dito antes, de Direitos de Solidariedade ou difusos e coletivos.
2.3.4 4ª Geração de Direitos Humanos
Já os Direitos Humanos de quarta geração decorrem da globalização e da maior necessidade de participação política ativa dos cidadãos, além das próprias questões ligadas à biotecnologia, conforme expõe Lenza:
‘Direitos Humanos de quarta geração, segundo orientação de Norberto Bobbio, referida geração de direitos decorria dos avanços no campo da engenharia genética, ao colocarem em risco a própria existência humana, através da manipulação do patrimônio genético. Segundo o mestre italiano: “... já se apresentam novas exigências que só poderiam chamar-se de direitos de quarta geração, referentes aos efeitos cada vez mais traumáticos da pesquisa biológica, que permitirá manipulações do patrimônio genético de cada individuo”. (LENZA, 2007 p.695)
Portanto, verifica-se que as quatro gerações de Direitos Humanos surgiram em contextos históricos distintos, opondo-se às contingências postas à desafiar a sociedade, seja oriunda da conduta do Estado, seja da conduta oriunda de particulares, ora como oposição à paradigmas ideológicos vigentes, ora para barrar os reflexos negativos dos avanços tecnológicos atrelados à questões bélicos ou biológicas.
Além disso, da geração de Direitos Humanos pode-se extrair as suas funções, o que restará evidente, também, o arcabouço de proteção do ser humano.
2.4 FUNÇÕES
Observa-se que nas qualificações das gerações se encontra a função das mesmas que destacam-se “[...] a clássica concepção de matriz liberal portuguesa, os direitos fundamentais cumpriam, originalmente, tão somente a função de direito de defesa do indivíduo contra os abusos gerados pela atuação do Estado. (CUNHA JÚNIOR, 2008 p.525).
Assumindo essa linha de pensamento levam-se em consideração que desta forma se efetivou a legalidade da atuação do Estado sobre seus cidadãos, ou seja, todas as entidades estatais ficaram limitadas à atuação legal; só poderiam atuar dentro do que lhe fossem permitido por lei. Qualquer posicionamento contrário ensejava na ilegalidade das suas ações ferindo assim todos os diplomas legais vigentes na atualidade.
Aliás, todos os preceitos constitucionais, notadamente aqueles que tem natureza de Direitos Humanos Fundamentais, identificam-se, em si, as funções dos referidos direitos, haja vista as múltiplas funções que os mesmo exercem.
Nessa linha de raciocínio, são as palavras de Cunha Jr., in verbis:
Os direitos fundamentais exercem múltiplas funções na ordem jurídica. Isso se justifica não só pelo contexto histórico no qual os direitos fundamentais foram gestados – dando ensejo a falar-se em gerações ou dimensões de direitos (direito de liberdade, de igualdade, de solidariedade e de globalização política, que são, respectivamente, direitos de primeira, segunda, terceira e quarta dimensão), em face das quais cada um desempenha papel diversificado –, como também pela compreensão da dupla perspectiva subjetiva-objetiva desses direitos [...].
Com efeito, pode-se identificar quatro funções dos Direitos Humanos Fundamentais, quais sejam: a função de defesa, a função de prestação, a função de proteção contra terceiros e a função de não discriminação.
A função de prestação origina-se dos direitos humanos de segunda geração e divide-se em normativa e material. A função de prestação normativa diz respeito à atuação legislativa do Estado na produção de normas direcionadas ao atendimento das necessidades sociais, enquanto que a função de prestação material se trata das políticas públicas propriamente ditas.
Já a função de não discriminação, também ligada aos direitos humanos de segunda geração, trata-se da vedação ao Estado praticar condutas discriminatórias, assim como ao próprio particular.
Contudo, interessa mais de perto para o presente trabalho a função de defesa e a função de proteção contra terceiros. Esta última se trata da gênese da chamada eficácia horizontal dos Direitos Humanos Fundamentais, função esta que impõe ao Estado a proteção do ser humano em decorrência de investida de violação de um outro particular.
Já a função de defesa origina-se dos chamados direitos humanos de primeira geração, visando, justamente, proteger o ser humano enquanto sua individualidade, dividindo-se em três situações: direito ao não impedimento às ações do titular do direito fundamental; direito à não afetação dos bens jurídicos protegidos; e direito à não eliminação de posições jurídicas.
Quanto ao direito ao não impedimento às ações do titular do direito fundamental, explica Cunha Jr. (2010, p. 525):
Com esteio nesta função, os direitos fundamentais inibem que o Estado impeça ou obstaculize determinadas ações do titular do direito, correspondendo a um direito ao não impedimento às ações do titular do direito fundamental. Assim, não pode o Estado obstaculizar o exercício de liberdades franqueadas (como, v.g., criar censuras prévias para a manifestação da liberdade artística ou religiosa, cercear a liberdade de locomoção e o direito de reunião), nem criar condições desmedidas para o exercício de uma profissão.
Nas palavras de Cunha Jr. (2010, p. 525), quanto ao direito de não-afetação dos bens jurídicos protegidos, tem-se o seguinte:
[...] os direitos fundamentais de defesa tutelam os bens jurídicos fundamentais contra as ações positivas do Estado que os venham atentar. Nessa medida, em razão, por exemplo, dos direitos à vida e à privacidade, o Estado não pode afetar os bens jurídicos por esses direitos protegidos. Esses direitos a ações negativas apresentam-se como direitos a que o Estado não afete determinadas propriedades ou situações do titular do direito. Os direitos de defesa correspondem, aqui, a um direito à não-afetação dos bens jurídicos protegidos, ou seja, como chama Alexy, direitos à não afetação de propriedade e situações.
Por fim, quanto direito à não eliminação de posições jurídicas, leciona Cunha Jr. (2010, p.. 525):
Os direitos de defesa ainda compreendem o chamado direito à não-eliminação de posições jurídicas, que impede sejam eliminadas do sistema jurídico determinadas posições jurídicas concretas do titular do direito, como, por exemplo, o direito de propriedade, o matrimônio, etc.
Portanto, verifica-se que os Direitos Humanos Fundamentais e suas funções trazem um arcabouços de proteções jurídico-materiais que servem para otimizar a dignidade da pessoa humana, bem jurídico este que serve de tábua axiológica do ordenamento jurídico.
3 O TRABALHO DO POLICIAL MILITAR NA BAHIA
Encontra-se neste tópico descrito a função policial militar pautada na Constituição Federal e em seu Estatuto de 2001, que, através do Art. 38, narra tão grandiosa missão na garantia da proteção dos direitos individuais da pessoa humana.
E como no percurso das suas atividades ocorrem os desvios de suas atividades para favorecimentos de poucos, contrariando a legalidade constitucional de suas atribuições, se remetendo a práticas ilícitas, há também a descrição da disciplina militar, bem como a indisciplina e seu efeito.
Além disso, tem-se a questão da ética profissional pautada em valores morais que é o verdadeiro corporativismo, e quando o mesmo torna-se nocivo para a sociedade, comprometendo a imagem da instituição por causa de más profissionais perante a mesma e como o estresse dentro da profissão vem acabando com os profissionais e porque há tanto estresse nesta atividade.
3.1 FUNÇÕES DA POLICIA MILITAR
Na Carta Constitucional de 1988, ficou estabelecido que incumbem às Policias Militares as funções de defesa interna da nação através do policiamento ostensivo e a manutenção da ordem pública, conforme se pode extrair do art. 144, § 5ª, in verbis: “Art. 144. [...]. § 5º. Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública;” (BRASIL,2010).
Obtendo a titularidade de militares estaduais sob comando direto dos governos dos Estados, sendo cada uma regida por seus estatutos conforme seu Estado, sendo certo que a Policia Militar do Estado da Bahia (PMBA) tem seu Estatuto estabelecido pela Lei nº. 7.990 de 27 de dezembro de 2001, atualizadas pelas Leis 8.639 de 15 de julho de 2003 e a 10.957 de 02 de janeiro de 2008.
Conforme esse Estatuto, tem-se que em seu Art. 1º regula o ingresso, as situações institucionais, as obrigações, os deveres, direitos, garantias e prerrogativas dos integrantes da PMBA, podendo-se observar que a parte mais importante se encontra elencada em seu Art. 38, caput, e seus incisos, transcrito abaixo: (BAHIA, 2008, p.35)
Art. 38 - São manifestações essenciais dos valores policiais militares:
I - o sentimento de servir à sociedade, traduzido pela vontade de cumprir o dever policial militar e pelo integral devotamento à preservação da ordem pública e à garantia dos direitos fundamentais da pessoa humana;
II - o civismo e o respeito às tradições históricas;
III - a fé na elevada missão da Polícia Militar;
IV - o orgulho do policial militar pela Instituição;
V - o amor à profissão policial militar e o entusiasmo com que é exercida;
VI - o aprimoramento técnico-profissional.
Neste Art. 38, inciso I, ressalta sem sombra de duvidas a função da PMBA e seus membros, demonstrando que o policiamento ostensivo serve para a manutenção da ordem pública, sendo que o mais importante é a garantia e manutenção dos direitos individuais da pessoa humana, previsto no art. 5º da Carta Magna pátria, e demais tratados de direitos humanos em que o Brasil é signatário. (BAHIA, 2008, p.46)
Deste modo, torna-se evidente a essência da profissão policial militar, sendo, justamente, a proteção da vida de todos, independente de seus atos.
3.2 ATIVIDADES DESEMPENHADAS E SEUS DESVIOS
Observa-se diversas atividades da PMBA e por muitas vezes tendo um determinado desvio da função na conformidade definida no Art. 144, inciso V, que a segurança é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, pois conforme prevista na Constituição Federal, sua missão, na conformidade do § 5º do mesmo dispositivo legal, cabe a ela o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública.
Quando se fala em desvio da função do policial militar, não se trata de função atípica que qualquer entidade estatal exerce, como função administrativa, gestão financeira, ouvidoria e até mesmo corregedoria, por exemplo, e sim policiamento ostensivo em âmbito particular com as armas do Estado, passando as viaturas a servirem a interesses particulares, um individuo e não a coletividade, como prever a Magna Carta de 1988, salvo exceções que se dá com a manutenção da ordem pública que ocorre quando grupos para-militares ou facções criminosas ameaçam o devido Estado Democrático de Direito representado por suas autoridades devidamente constituídas. (BRASIL, 2010 p.52)
Onde há representatividade do poder emanada do povo e para o povo, só quando a harmonia constitucional é ameaçada cabe o uso da Policia Militar, para a manutenção da ordem pública na menção do texto constitucional.
Torna-se um abuso de poder quando uma guarnição que deveria estar fazendo o policiamento ostensivo fica guardando, por exemplo, a casa do comandante geral da PMBA, ou, ainda, sem qualquer motivo passa a fazer um policiamento ostensivo individual, que no texto constitucional seria coletivo, situações estas que, por vezes, se estendem para juízes, promotores de justiça deputados estaduais e federais, sem o amparo jurídico da CF/88, desviando assim um número grande de policiais do mais baixo ao mais alto escalão da PMBA.
Observa-se que as atividades constitucionais da Policia Militar não está na legalidade que prever a lei (BRASIL, 2010), ficando os cidadãos descobertos e pagando pelo serviço de segurança pública que não funciona na prática, acabando tendo que se socorrer com serviço de segurança particular.
Segundo Arrais (2010), “Os embriões dos grupos de extermínio nascem quando comerciantes e outros empresários recrutam matadores de aluguel, freqüentemente entre policiais militares, e civis, para o que chamam ‘limpar’ o ‘seu’ bairro ou sua cidade”.
Registre-se, também, que em muitos casos o cidadão acaba tendo que pagar uma milícia, que são, na verdade, força paralela às instituições democraticamente estabelecidas e em sua maioria composta por profissionais das instituições estatais, ganhando novamente para fazerem o que deveriam, agindo totalmente fora dos princípios legais.
Segundo Arrais (2010), “Não raro essas organizações ampliam seus leques de prática criminosas executando seqüestros, assaltos, narcotráfico e etc. Afinal, quem mata por dinheiro dificilmente terá limites morais para a prática de outros crimes”, destacando-se por sua crueldade, sendo certo que seu preparo militar permite assumir toda a localidade, passando a coagir aqueles que eram seus patrões, tornado-se reféns e vitimas de seus supostos salvadores.
Com efeito, tornando-se acima da lei e da ordem estabelecida, este grupo passa a legislar, julgar e executar aqueles que são tomados por suspeitos ou traidores da organização, sendo certo que aqueles que não pagam a taxa estipulada pelo grupo acaba assumindo a inadimplência com a própria vida.
Nesse contexto, acaba-se implantando a lei do silencio na comunidade, o que não é desrespeitadas, pois o custo seria a própria vida. Assim, pode-se constatar que quando o Estado se omite, não cumprindo com seu papel social, ocorrerá constantemente vidas perdidas sem qualquer motivo, ou seja, a banalização dos princípios constitucionais, ficando a Constituição somente no plano ideal, sem sua efetivação.
3.3 A DISCIPLINA MILITAR
No dicionário Aurélio (2001, p.239), o termo disciplina pode ser definido como “regime de ordem imposta ou livremente consentida: ordem que convém ao funcionamento regular de uma organização: relação de subordinação do aluno ao mestre ou ao instrutor, observância de preceitos ou normas: submissão a um regulamento”.
Verifica-se que o termo disciplina tem assumido ao longo do tempo diferentes significações: punição, dor, direção moral, regra de conduta para fazer reinar a ordem numa coletividade, obediência à regra. Há assim, uma disciplina familiar, como há uma disciplina militar, religiosa, desportiva, partidária, sindical, dentre outras. Portanto, as regras e leis são criadas pelas sociedades que através da cultura propaga os seus ensinamentos, formando atitudes e pensamentos de acordo com o grupo social existente.
Nesse contexto, constata-se que a disciplina é necessária para a convivência em sociedade, sendo que existem várias formas de concebê-la.
Segundo Estrela (1994 p.15): “O termo disciplina é susceptível de muitas interpretações que hoje tendem não apenas evocar as regras e a ordem delas decorrentes como as sanções ligadas aos desvios e o conseqüente sofrimento que elas originam”.
É necessário que as pessoas saibam que precisam de certa organização para viver em sociedade, compreendendo que se deve ter determinados limites. O cidadão tem direito e deveres a serem cumpridos para viver em harmonia. O desacato a essas normas constitui a indisciplina. As vertentes dadas ao conceito de disciplina e indisciplina se diferenciam pelo período histórico.
De acordo com Estrela (1994 p.15), O conceito de indisciplina relaciona-se intimamente com o de disciplina e tende normalmente a ser definida pela sua negação, privação ou pela desordem proveniente da quebra de regras estabelecidas.
La Taille, buscando definir a disciplina, reflete:
O que é disciplina? O que é sua negação indisciplina? Não é tão simples. Se entendermos por disciplina comportamentos regidos por um conjunto de normas, a indisciplina poderá se traduzir de duas formas: 1) a revolta contra essas normas; 2) o desconhecimento delas. No primeiro caso, a indisciplina traduz-se por uma forma de desobediência insolente; no segundo, pelo caos dos comportamentos, pela desorganização das relações. Aproveito para dizer que hoje o segundo caso parece-me valer. (1996 p.10)
Deste modo, toda e qualquer atividade atribuída ao serviço policial, não pautada na lei traz o caos da ilegalidade e suas mazelas ao seio da sociedade que deverá arcar solidariamente e não poderá se exonerar de tais atos, só cabendo reparação quando puder ser no todo ou em parte.
3.4 A ÉTICA PROFISSIONAL E O CORPORATIVISMO
Encontra-se a ética profissional bem definida no Estatuto Policial Militar, a qual todos deveriam buscar sua efetivação como se encontra, posto em seu Art. 39, principalmente no inciso III, que vem reforçar o respeito á dignidade da pessoa humana,
Muitos podem questionar se essa constante repetição não seria uma redundância, o que por certo, não é, tendo em vista as constantes condutas desviadas. Com efeito, até que poderia se considerar redundância se as pessoas andassem cumpridoras dos deveres, respeitando o próximo.
Contudo, o fato é que a população em geral pratica quase que completamente o contrario do que está posto na lei, não respeitando o próximo e querendo ser respeitado em relação aos direitos. Fere-se qualquer principio constitucional quando em uma abordagem a um cidadão um dos membros da guarnição o desrespeita ou o cidadão desrespeita o policial que estar trabalhando para a sua proteção, sendo certo que os direitos humanos nessas situações são destruídos, não observando-se, inclusive, os preceitos do art. 39 do Estatuto, in verbis:
Art. 39. O sentimento do dever, a dignidade policial militar e o decoro da classe impõem a cada um dos integrantes da Polícia Militar conduta moral e profissional irrepreensíveis, tanto durante o serviço quanto fora dele, com observância dos seguintes preceitos da ética policial militar:
I - amar a verdade e a responsabilidade como fundamento da dignidade pessoal;
II - exercer com autoridade, eficiência, eficácia, efetividade e probidade as funções que lhe couberem em decorrência do cargo;
III - respeitar a dignidade da pessoa humana;
IV - cumprir e fazer cumprir as Leis, os regulamentos, as instruções e as ordens das autoridades competentes, à exceção das manifestamente ilegais;
V - ser justo e imparcial no julgamento dos atos e na apreciação do mérito dos subordinados;
VI - zelar pelo preparo moral, intelectual e físico próprio e dos subordinados, tendo em vista o cumprimento da missão comum;
VII - praticar a solidariedade e desenvolver permanentemente o espírito de cooperação;
VIII - ser discreto em suas atitudes e maneiras e polido em sua linguagem falada e escrita;
IX - abster-se de tratar de matéria sigilosa, de qualquer natureza, fora do âmbito apropriado;
X - cumprir seus deveres de cidadão;
XI - manter conduta compatível com a moralidade administrativa;
XII - comportar-se educadamente em todas as situações;
XIII - conduzir-se de modo que não sejam prejudicados os princípios da disciplina, do respeito e do decoro policial militar;
XIV - abster-se de fazer uso do posto ou da graduação para obter facilidades pessoais de qualquer natureza ou para encaminhar negócios particulares ou de terceiros;
XV - abster-se, na inatividade, do uso das designações hierárquicas quando:
a) em atividade político-partidária;
b) em atividade comercial ou industrial;
c) para discutir ou provocar discussões pela imprensa a respeito de assuntos políticos ou policiais militares, excetuando-se os de natureza exclusivamente técnica, se devidamente autorizado;
d) no exercício de funções de natureza não policiais militares, mesmo oficiais.
XVI - zelar pelo bom conceito da Polícia Militar;
XVII - zelar pela economia do material e a conservação do patrimônio público.
Nesta visão não é demais ressaltar que a dignidade humana nunca é demais ser lembrada e respeitada, em todos seus aspectos, por mais simples que seja.
3.5 O ESTRESSE DENTRO DA PROFISSÃO
Na profissão exercida pelo policial militar, observa-se um alto nível de estresse, tendo em vista, justamente, essa guerra particular vivida constantemente, submetido em um alto nível de exigência sem trégua, considerando-se que, por ser policial militar, não pode errar.
Corroborando com as essas afirmações, o policial militar torna-se vitima de um sistema de trabalho, perverso, onde o integrante da PMBA que vive integralmente a função policial sem uma boa qualidade de vida, entrará em um circulo vicioso, pois o mesmo terá seu sistema alterado por não haver um relaxamento, tendo em vista que estará em vigilância constante mesmo fora do serviço.
Essa situação, essencialmente negativa para o policial militar, gera reflexos em sua conduta, o que passa a contrariar os valores morais da instituição que serve e da própria Constituição Federal de 1988, principalmente em relação aos seus direito fundamentais, que são dilacerados de todas as formas, causando reflexos negativos na forma de abordar o cidadão.
4 USO LEGÍTIMO DA FORÇA
4.1 A FORÇA EM SUAS MODALIDADES
Há uma legislação especifica para o uso legitimo da força, conforme está inserido na Resolução nº 34/169 da ONU (Organização das Nações Unidas), Código de Conduta para Policiais adotado no Oitavo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinqüentes realizado em Havana, Cuba, de 27 de Agosto a 7 de Setembro de 1990.
Especial atenção deve ser dada ao art. 2º da referida Resolução, pois diz que “no cumprimento do seu dever, os policiais devem respeitar e proteger a dignidade humana, manter e apoiar os direitos fundamentais de todas as pessoas”.
Merece destaque, também o que estabelece o art. 3º da mencionada Resolução, in verbis: “Os policiais só podem empregar a força quando tal se apresente estritamente necessário, e na medida exigida para o cumprimento do seu dever”.
Aliás, a força empregada pelo policial deve ser de acordo com a necessidade que o caso concreto impõe, devendo fazer uso da arma de fogo somente como último recurso, ou seja, quando for necessário.
Isso é o que se pode extrair do art. 8º da Resolução acima referida, in verbis:
ARTIGO 8.º
2. Os Governos e os organismos de aplicação da lei devem desenvolver um leque de meios tão amplo quanto possível e habilitar os policiais com diversos tipos de armas e de munições, que permitam uma utilização diferenciada da força e das armas de fogo. Para o efeito, deveriam ser desenvolvidas armas neutralizadoras não letais, para uso nas situações apropriadas, tendo em vista limitar de modo crescente o recurso a meios que possam causar a morte ou lesões corporais. Para o mesmo efeito, deveria também ser possível dotar os policiais de equipamentos defensivos, tais como escudos, viseiras, coletes anti-balísticos e veículos blindados, a fim de se reduzir a necessidade de utilização de qualquer tipo de armas.
4. Os policiais, no exercício das suas funções, devem, na medida do possível, recorrer a meios não violentos antes de utilizarem a força ou armas de fogo. Só poderão recorrer à força ou a armas de fogo se outros meios se mostrarem ineficazes ou não permitirem alcançar o resultado desejado.
5. Sempre que o uso legítimo da força ou de armas de fogo seja indispensável, os policiais devem:
a) Utilizá-las com moderação e a sua ação deve ser proporcional à gravidade da infração e ao objetivo legítimo a alcançar;
b) Esforçar-se por reduzirem ao mínimo os danos e lesões e respeitarem e preservarem a vida humana;
c) Assegurar a prestação de assistência e socorros médicos às pessoas feridas ou afetadas, tão rapidamente quanto possível;
d) Assegurar a comunicação da ocorrência à família ou pessoas próximas da pessoa ferida ou afetada, tão rapidamente quanto possível.
[...]
9 - Policiais não devem usar armas contra pessoas, exceto para se defender ou defender terceiros contra iminente ameaça de morte ou lesão grave, para evitar a perpetração de um crime envolvendo grave ameaça à vida, para prender pessoa que represente tal perigo e que resista à autoridade, ou para evitar sua fuga, e apenas quando meios menos extremos forem insuficientes para atingir tais objetivos. Nesses casos, o uso intencionalmente letal de arma só poderá ser feito quando estritamente necessário para proteger a vida.
Assim, da analise do referido documento pode-se notar que a PMBA tem andado na contra-mão da história, pois a mesma pratica o último recurso – utilização da arma de fogo – a todo o tempo, tornando-se o cotidiano do policial militar.
4.2 O USO DA FORÇA NA ATIVIDADE POLICIAL MILITAR: UM FOCO NA UTILIZAÇÃO DA ALGEMA
A palavra algema é originária do idioma arábico, al jamad e tem o significado de pulseira, no sentido de aprisionar, um instrumento empregado para impedir reações indevidas, incontroláveis ou agressivas por presos em relação aos policiais, contra si mesmo ou contra terceiros.
Quanto ao uso de algemas, diz Maria Elizabeth Queijo que só se admite “a contenção física de alguém, por meio de algemas, quando houver resistência, perigo de fuga, ameaça à vida ou à integridade física de terceiros”, acrescentando que “tal perigo não é presumido, devendo ser apurado objetivamente, a partir de informações que constem de registros policiais, judiciais ou mesmo do estabelecimento prisional”.
O artigo 199 da Lei de Execuções Penais remete a disciplina do uso de algemas a Decreto Federal – que ainda não existente –, restando a advertência de que as mesmas só podem ser utilizadas quando estritamente forem necessárias pelas circunstâncias, não podendo desmoralizar aqueles que são presos, principalmente quando for perante as câmeras ou nas audiências, sob pena de se caracterizar abuso de autoridade.
Registre-se que o uso de algemas deve ser excepcional e justificado por razões de cautela, quando houver risco à integridade física dos envolvidos no ato prisional (policiais, vitimas e aprisionados).
Justifica-se o estudo, por entender que a complexidade de uso de algemas pelo policial deve ser analisada como sendo o agente da lei um sujeito amparado pelo direito. Nesse caso, a discussão diz respeito à manutenção da integridade física do policial que em seu dia-a-dia de trabalho lida com transgressores da lei, sobretudo correndo riscos que a profissão lhe impôs.
Na atividade policial as algemas é um instrumento fundamental, por fazer parte de um conjunto mínimo de segurança que um policial deve ter ao exercer suas atividades.
As forças policiais são cobradas a agir em caso de situação em que um flagrante delito está sendo cometido. No Código de Processo Penal diz o artigo 301: “qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”.
Como se pode constatar, os agentes policiais são obrigados a agir em situação de flagrante, quando há possibilidade de ação e que não deixe o policial em desvantagem.
O uso da força deve ser evitado, salvo quando indispensável no caso de resistência ou tentativa de fuga do preso (artigo 284 do Código de Processo Penal). O uso desnecessário da força, ou excessos, pode caracterizar abuso de autoridade, lesões corporais, homicídio etc.
Antes da edição da Súmula Vinculante nº 11, alguns diplomas legais já traziam espécies de orientações a serem seguidas na utilização das algemas nas prisões de infratores e suspeitos. Mesmo não mencionando a expressão algema, o Código de Processo Penal trazia regulamentos que poderiam ser interpretados também para o uso legal desta, sem ferir a dignidade da pessoa humana. Podemos citar como exemplo o que dispõe o artigo 292 do Código de Processo Penal:
Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também por duas testemunhas.
No artigo supracitado, em caso de uma resistência do conduzido, é possível a utilização dos meios necessários, não há alguma menção em algemas, mas induz que elas sejam fundamentais neste contexto, a fim de evitar um possível confronto corporal ou até mesmo envolvendo armas de fogo.
Assim, as algemas acabam por englobar o universo extenso do termo meios necessários, desde que sejam utilizadas como forma de conter uma agressão, resistência ou fuga, e não como meio de punição ou exposição pública contra qualquer pessoa.
Na situação de flagrante não se tem tempo para verificar se a situação se enquadra dentro de um desses preceitos ou não. Conter indiciados ou suspeitos serve para se evitar uma agressão ou uma tentativa de fuga. Não há como prever qual será a atitude de uma pessoa ao tomar conhecimento que está sendo detida e que pode levar a conseqüências piores. Assim, a utilização das algemas se faz necessária.
Pode-se registrar, também, que no caso de menor de idade ser detido em razão do cometimento de algum ato infracional, é aceitável a utilização das algemas na condução deste. A proibição da legislação versa no sentido de que os menores não podem ser transportados nos compartimentos fechados das viaturas policiais, sob alegação que tal procedimento violaria a dignidade do menor conduzido.
A Promotora de Justiça Selma Sauerbronn de Souza retrata o pensamento inequívoco que se deve ter em relação ao uso das algemas quando se tem menores envolvidos em uma ocorrência:
[...] Em face do vigente Diploma Menorista, perfeito o entendimento que o uso de algemas no adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional, deixou de ser uma regra geral, passando a ser conduta excepcional por parte da autoridade policial, seja civil ou militar, quando tratar-se de adolescente de altíssimo grau de periculosidade, de porte físico compatível a um adulto, e que reaja a apreensão. Algemá-lo, certamente, evitará luta corporal e fuga com perseguição policial de desfecho muitas vezes trágico para o policial ou para o próprio adolescente. Portanto, o policial que diante de um caso concreto semelhante ao narrado, optar pela colocação de algemas, na realidade estará preservando a integridade física do adolescente, e, por conseguinte, resguardando o direito à vida e à saúde, assegurados pela Constituição Federal, e como não poderia deixar de serem, direitos substancialmente, consagrados pelo ECA [...]
Nota-se que a utilização das algemas é relevante na função policial. Os abusos não devem ser cometidos e se ocorrerem deverão ser investigados e punidos nos termos da lei. É necessário estabelecer critérios que garantam a dignidade de quem for detido. Uma das principais queixas é quando há a presença da mídia no momento da detenção, isto faz com que o uso das algemas se torne um vexame e por isso é necessário que se evite esta exposição.
A algema é uma forma de neutralização da força, contenção e imobilização do delinqüente e não o emprego da força, devendo ser utilizada quando necessário.
O ato de algemar não é um constrangimento ilegal. Poderá sê-lo se procedido tão somente para filmagem e divulgação em rede nacional, o que sujeita o policial a sanções disciplinares.
A discussão quanto ao uso de algemas durante o julgamento perante o Tribunal do Júri, é alvo de constantes polêmicas e assunto ainda sem uma definição legal, já que elas impressionam os jurados, que podem ser influenciados diretamente, mesmo que de forma inconsciente. Como julgam de acordo com a íntima convicção, o prejuízo ao réu não tem como ser determinado. As algemas afrontam a dignidade do réu e a presunção de inocência, já que são símbolo da condenação, mesmo antes da sentença, podendo implicar até em nulidade do julgamento em plenário do Júri.
A Lei nº 11.689/09, dando nova redação ao artigo 474 do Código de Processo Penal, em seu § 3º diz que: “Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período que permanecer no plenário de júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes”.
É evidente que a proporcionalidade é da essência do ato, devendo estar devidamente justificada e se fazer constar do termo de audiência. O arbítrio pode ser suscitado em preliminar de futura apelação, ensejando nulidade do julgamento.
Segundo STF e o STJ, o uso de algemas no Júri não constitui constrangimento quando for necessária à ordem dos trabalhos e à segurança dos presentes.
O STF na apreciação do HC nº 91.952 (Plenário – Rel. Min. Marco Aurélio – j. 07.08.08 – votação unânime), anulou o julgamento em plenário do júri, de um pedreiro que permaneceu algemado durante a sessão, acusado de homicídio na cidade de Laranjal Paulista, sob o fundamento de ter ocorrido potencial influência perante os jurados, não havendo demonstração de que tal expediente fosse necessário no caso concreto.
O uso de algemas tem caráter excepcional. Com base nesse entendimento, o Tribunal concedeu habeas corpus — impetrado em favor de condenado à pena de 13 anos e 6 meses de reclusão pela prática dos crimes previstos no art. 121, § 2º, II, III e IV, do CP, e no art. 10, da Lei 9.437/97 — para tornar insubsistente a decisão do Tribunal do Júri, e determinar que outro julgamento seja realizado, com a manutenção do acusado sem as algemas. Na espécie, o paciente permanecera algemado durante toda a sessão do Júri, tendo sido indeferido o pedido da defesa para que as algemas fossem retiradas, ao fundamento de inexistência de constrangimento ilegal, sobretudo porque tal circunstância se faria necessária ao bom andamento dos trabalhos, uma vez que a segurança, naquele momento, estaria sendo realizada por apenas dois policiais civis, e, ainda, porque o réu permanecera algemado em todas as audiências ocorridas antes da pronúncia.
A Súmula Vinculante nº 11 advém dos habeas corpus nº 84.429 e nº 91.952. O primeiro diz respeito à prisão em flagrante efetuada pela Polícia Federal em que os ministros concluíram que foi exposta desnecessariamente a imagem do acusado. Já o segundo trata da anulação do Tribunal do Júri que tratamos acima.
Menciona a recente Súmula Vinculante de nº 11, do Supremo Tribunal Federal, nos seguintes termos:
Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.
Em face da edição do enunciado da súmula vinculante sobre o uso de algemas, especialmente levando em consideração que o Código de Processo Penal Militar, em seu artigo 234, prevê que “o emprego de força só é permitido quando indispensável, no caso de desobediência, resistência ou tentativa de fuga”, podendo ser usados, se houver resistência da parte de terceiros, “os meios necessários para vencê-la ou para defesa do executor e auxiliar seus, inclusive a prisão do ofensor”, lavrando-se, de tudo, auto subscrito pelo executor e por duas testemunhas”. No parágrafo primeiro daquele dispositivo, está dito que “o emprego de algemas deve ser evitado, desde que não haja perigo de fuga ou de agressão da parte do preso, e de modo algum será permitido, nos presos a que se refere o artigo 242”. A parte final desse dispositivo, ao vedar o uso de algemas em determinadas autoridades e portadores de diploma de curso superior, afigura-se uma não isonomia, por não se compatibilizar com o sistema constitucional. Entretanto, a primeira parte do texto normativo indica os limites para o uso de algemas e se ajusta aos ditames da Constituição Federal.
Cabe ressaltar não serem atendidos os requisitos para a edição da própria súmula vinculante, ou seja, para que se justificasse a emissão da súmula vinculante sobre o uso de algemas.
Seria necessário que existissem reiteradas decisões sobre a matéria constitucional, versando sobre a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais houvesse controvérsia atual entre os órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarretasse grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica, nos termos do artigo 103-A, § 1º, da Constituição Federal.
Ao que parece a edição da citada Súmula veio contextualizada, houve inúmeros excessos em atos prisionais espetaculosos, com objetivos nitidamente institucionais, a merecer a reprimenda e o controle do Poder Judiciário.
O Superior Tribunal de Justiça, em acórdão do Ministro José Arnaldo da Fonseca, entendeu que:
O uso de algemas há de ser aferido em cada caso concreto, não podendo haver decisum amplo, coibindo-o. Dentro dessa linha, parece-me mais sensato deixar a cargo da autoridade condutora do réu o melhor caminho a seguir, desde que não sejam tomadas providências desnecessárias e inconseqüentes, demonstradas por sinal no presente caso”. (STJ, 5ª Turma, HC 35.540, publicado DJ em 06.09.2004).
Confira-se outra decisão do STJ:
Uso de algemas. Avaliação da necessidade – A imposição do uso de algemas ao réu, por constituir afetação aos princípios de respeito à integridade física e moral do cidadão, deve ser aferida de modo cauteloso e diante de elementos concretos que demonstrem a periculosidade do acusado. Recurso provido”. (RHC nº 5.663 – SP, 6ª Turma, j. 19.87.1996, rel. Min. William Patterson, v.u., DJU 23.9.1996, pág. 35.157).
Destarte, vê-se que o magistrado não deve ficar limitado apenas aos ditames da referida súmula, mas exercer o poder de polícia dentro da sala de audiência, devendo zelar pela ordem dos trabalhos e segurança dos presentes.
Constata-se, portanto, que a utilização da força, notadamente no que toca à arma de fogo, somente deverá ocorrer se realmente for necessário, o mesmo ocorrendo em relação ao uso das algemas, justamente por proteção aos direitos fundamentais do cidadão, não deslegitimando a conduta do policial militar..
Aliás, visando, justamente, aproximar a polícia militar e a população, viabilizando o policiamento preventivo e o respeito dos direitos fundamentais, é que criou-se a chamada polícia comunitário, também denominada de polícia cidadã.
4.3 A POLÍCIA CIDADÃ DO ESTADO DA BAHIA
A Polícia Comunitária surge, na Bahia, sob o signo de Polícia Cidadã, que nasceu do Projeto Polícia Cidadã desenvolvido, na década de 1990, pela Polícia Militar da Bahia em conjunto com a Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia. A finalidade da Polícia Cidadã é criar uma nova política de policiamento que prioriza a prevenção através da participação comunitária, afastando-se das formas tradicionais de policiamento repressivo que criou uma barreira entre a polícia e o cidadão.
Registre-se que se trata de um projeto elaborado pela UFBA em conjunto com a PMBA, projeto este que sérvio para se buscar a melhor solução técnica na gestão administrativa.
Contudo, o fato é que na pratica os resultados mostrados não retratam o alcance dos objetivos almejados pelos mentores do projeto, tendo em vista o aumento da criminalidade e da alta taxa de homicídios, conforme demonstra o gráfico a seguir:
Assim, nessa conjuntura política a população, infelizmente, vem realizando justiça com as próprias, mãos visto que deste modo conturbado é mais efetivo e célere.
4.4. RESPEITO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A LEGITIMIDADE DA ATIVIDADE POLICIAL
Encontra-se consolidado a dignidade da pessoa humana na Constituição Federal de 1988 promulgada em 5 de Outubro do mesmo ano. Esse instituto é o pilar constitucional que garante todos os direitos fundamentais, individuais e coletivos não cabendo qualquer retrocesso de nenhuma ordem. Encontra-se positivado em seu Art. 1º que determina a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Município e Distrito Federal, constitui em um Estado Democrático de Direito e tem como fundamento a soberania; a cidadania; a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; e o pluralismo político. E para a sua complementação encontramos o parágrafo único do mesmo artigo que determina que todo o poder emana do povo que o exerce por meio de representante eleitos ou diretamente nos termos desta Constituição. (BRASIL, 2010 p.7)
Observando a norma constitucional, deve-se destacar a importância do novo sentido de interpretação dos diplomas legais que é agora a interpretação constitucionalista que fragmenta o instituto da dignidade da pessoa humana em vários sentidos: Direito a vida, a igualdade, a liberdade, liberdade de ação, de locomoção, de opinião ou pensamento, de expressão intelectual, artística, científica e de comunicação, o direito de informar e ser informado, o direito da crítica jornalística, liberdade da ciência e da crença, liberdade de reunião.
Registre-se, ainda, a liberdade de associação, liberdade de opção profissional, direito a privacidade, direito à intimidade, direito a vida privada, direito a honra e a imagem, direito a inviolabilidade da casa, direito ao sigilo de correspondências e de todos os tipos de comunicações, direito de propriedade, direito a propriedade intelectual, direito a segurança em matéria penal e processual que deverão observar o devido processo legal garantindo o contraditório e a ampla defesa e dentre outros, sendo que nessa observância os direitos fundamentais não são mais restritivos e sim “erga omnes” (CUNHA JÚNIOR, 2008, p.635 - 678)
5 CONCLUSÃO
Constata-se que a indisciplina na atividade policial deve ser analisada em diferentes perspectivas, pois diversos fatores contribuem para a sua manifestação, ela está relacionada a problemas sociais, econômicos, culturais A priori devem-se investigar suas razões para então buscar alternativas que ajudem a amenizar a questão.
A sociedade, da forma em que está organizada, obriga os policiais militares a se ausentarem do lar por um longo período, eximindo-se do convívio familiar, deixando uma enorme lacuna para o uso de drogas licitas ou até mesmo as ilícitas provocando a desagregação familiar muitas vezes com o seu termino gerando graves problemas sociais. Constata-se que muitas policiais ficam na ociosidade, sem qualquer tipo de atividade física ou vão fazer bicos na sua folga para complementar a rendar familiar, ficando tão estressados que reverte isso para a família e para a sociedade, agindo de forma violenta.
É dizer: vai incentivar seu comportamento indisciplinado, refletindo falhas nos processos de conduta profissional, que vai atingir a quem deveria proteger, sendo o cidadão sua principal vitima assim como no âmbito familiar.
Percebe-se que uma parcela dos profissionais age desta forma, por não ter uma visão crítica e reflexiva da sua prática pensam que estão de acordo com a legalidade.
Do mesmo modo que os nazistas se conduziram, não sabem distinguir um comportamento indisciplinado de uma dificuldade de aprendizagem, atribuindo a origem da indisciplina ao cidadão que o desrespeitou ou de sua família que não te obedecem como se sua casa fosse uma extensão do quartel. É fundamental o desenvolvimento de atividades dinâmicas, lúdicas e adequadas às características de cada um e a sua faixa etária.
Assim, deve-se aproveitar o conhecimento prévio, promovendo a troca de informações, tentando aproximar o conhecimento à sua realidade, buscando um planejamento dessas atividades para não deixar espaço vago para o aparecimento da inversão de comportamento retirando sua agressividade exercida dentro do âmbito profissional ou familiar.
Em relação aos profissionais da policia militar, uma das causas da indisciplina é a falta de entendimento das leis e a internalização dos valores que estão em crise na sociedade atual.
É notória a necessidade e a importância de criar um elo entre a família e a vida profissional, possibilitando-se, assim, a orientação dos policiais para o cumprimento das leis, respeitando seus limites com profissional da policia militar.
E aos limites e regras impostas ajudam o respeito dos direitos individuais de cada ser, possibilitando o aprendizado no sentido de se respeitar as regras e limite social necessárias ao desenvolvimento que a autonomia profissional requer.
Foi nítida a percepção de que o militarismo não está preparado para receber a nova clientela, que por ser heterogênea, traz informações diversificadas que muitas vezes não são aproveitadas na para a construção de uma saciedade mais justa, por falta de habilidades do policial militar a trabalhar esse tipo de diferenças estabelecidas na constituição, com esse tipo de conhecimento.
Para construir um ambiente de harmonia na sociedade, convém que as regras sejam coerentes, construídas com a colaboração dos profissionais que realmente convivem com as mazelas da população, havendo entrosamento, divisão de responsabilidades e cooperação. É importante que o policial seja humano, porém firmes, seguros e convictos em seus posicionamentos e ao mesmo tempo amorosos e flexíveis dentro da legalidade atribuída pela profissão, transmitindo uma imagem de autoridade e não de autoritarismo.